Um espaço seguro, exclusivo para as mulheres, que oferece uma experiência transformadora: o descobrimento da potência orgástica e dos estados de prazer do corpo feminino. Esta é a proposta da Casa Prazerela, localizada na Vila Madalena, zona oeste da cidade de São Paulo.
A iniciativa foi criada no início de 2017 pela comunicóloga e psicanalista Mariana Stock com a missão de apoiar as mulheres a se empoderarem de sua sexualidade. Neste começo, a idealizadora do projeto dava palestras sobre o tema, mas, em novembro do mesmo ano, sentiu a necessidade de abrir um espaço físico em que as participantes pudessem se encontrar e viver experiências de descobertas do prazer.
A principal experiência oferecida pela Casa Prazerela é a terapia orgástica, que induz a mulher a ter ou intensificar o orgasmo. “A gente conhece muito pouco dessa descarga de prazer nas relações íntimas porque vivemos numa sociedade repressora da sexualidade feminina. Por isso, a gente busca olhar a sexualidade por um viés da positividade”, afirma Mariana em entrevista à Catraca Livre.
Além da terapia orgástica, o espaço tem encontros, como palestras e cursos (presenciais ou online), em que são abordadas questões relacionadas à sexualidade feminina e sexo. Para a criadora do local, antes de viver uma experiência no corpo, é muito importante que a mulher seja capaz de refletir sobre o assunto. “Os cursos trazem esse diálogo, pois a primeira carência que temos é a de fala, de não saber nomear o que sentimos.”
Mas o que é a terapia orgástica?
As sessões de terapia orgástica são individuais, sempre feitas com terapeutas mulheres, nas quais a paciente vai viver uma experiência sensorial no corpo. Tudo começa com um processo de consciência corporal e só depois tem início a descoberta da energia vital do genital. Cada sessão dura em média duas horas e as mulheres são convidadas a ficarem nuas para vivenciar a experiência no corpo.
Em geral, o resultado é muito forte porque é uma descarga orgástica que grande parte das pessoas não está acostumada a viver no dia a dia. “Por isso, se a pessoa tem muitas dúvidas e tabus sobre sexualidade e sexo, participar antes dos cursos pode dar uma tranquilizada. Mas não é um impeditivo: é possível fazer a terapia orgástica sem os encontros”, explica Stock.
Sobre o perfil das mulheres que frequentam a Casa, ela relata que, antes, era predominantemente composto por pessoas entre 30 e 40 anos, mas hoje a variedade do público se ampliou. “Cada vez temos recebido mulheres mais velhas. Na terapia orgástica, por exemplo, recebemos mulheres de 80 anos”, diz. A experiência é realizada com mulheres a partir de 18 anos e o número de sessões fica a critério de cada uma.
Após as sessões, muitas pacientes enviam relatos sobre o que sentiram. “O que elas descobrem aqui vai muito além de um orgasmo potente. Quando a mulher vive essa sensação, isso se propaga para todas as esferas da sua vida, nos relacionamentos, no trabalho… Um lugar de segurança, de autoestima e de liberdade. Elas vêm aqui achando que vai ser uma grande descoberta da sexualidade, mas acaba se tornando uma transformação na vida.”
Segundo a idealizadora da iniciativa, muitas mulheres chegam à Prazerela se sentindo extremamente culpadas e envergonhadas. Por isso, a ideia do espaço é acolher e mostrar que essa sensação é reflexo da sociedade, atravessada por questões machistas, em que o lugar do prazer e da libido feminina é muito reprimido.
“Aqui, a gente começa a explicar de uma forma natural, embasada e científica o que é o corpo biológico da mulher, o que é um clítoris, como a gente encontra formas de desconstruir esse julgamento que temos sobre a sexualidade. A principal barreira que a gente tem para viver essa sexualidade de uma forma plena e positiva é a mente castradora que nos boicota”, reflete.
Sexo e sexualidade
Para Mariana Stock, é muito importante a gente entender que sexo e sexualidade são coisas diferentes. Hoje, o que temos de educação não é a respeito de sexualidade, mas, sim, de sexo. “A gente pula justamente o primeiro capítulo dessa história que é a individualidade. Quando falamos de sexualidade, é sobre reconhecer antes o nosso corpo, de reconhecer os nossos limites e as nossas zonas prazerosas e erógenas”, afirma. “Quando falo de sexo, já é a respeito de uma interação com o outro.”
Ao pular a etapa de conhecer a nós mesmos, o espaço do sexo se torna algo baseado em performance, e todo mundo perde nessa história. “A mulher fingindo que goza, e o homem fingindo que está tudo bem naquela performance ‘bate-estaca’. Assim ninguém vive a potência da sexualidade, nem os homens nem as mulheres. Precisamos voltar algumas casas nessa história para aprender sobre sexualidade.” Antes de tudo, é necessário que cada uma entenda o que gosta e o que a faz sentir prazer e gozar.
A grande demanda das mulheres que procuram a iniciativa é falar sobre as dificuldades de gozar, de entender o próprio corpo e de se masturbar. “Essas questões são muito iniciantes. Se a gente tivesse tido educação sexual na infância e adolescência, poderíamos estar em outro patamar da sexualidade. Na nossa sociedade, às vezes nem entre amigas temos esse espaço de troca e diálogo, sempre há um olhar de julgamento. Mas a verdade é que não há mulher bem resolvida porque a gente vive numa sociedade que não incentiva isso”, completa.
Isso tudo é consequência do sexo cisheteronormativo, extremamente falocêntrico. “A gente quer que tudo aconteça em torno do ‘astro’ pênis”, explica. “Esse é um problema para nós, mulheres, porque para a gente a penetração é a parte menos prazerosa de uma relação sexual. Para os homens, embora privilegiados, também é um problema porque gera uma ansiedade, uma angústia de ter que sustentar aquela ereção o tempo todo. O que vem antes da penetração é a melhor parte do sexo para nós.”
do site Catraca Livre