A pantera dos olhos dormentes |
Vamos falar de história.
A capital da Paraíba completa hoje 434 anos de existência. Mas ela nem sempre se chamou João Pessoa.
E não tem como contar a história desse nome sem falar de Anayde Beiriz.
Poeta e professora, ela escandalizou a sociedade da Paraíba sendo apenas ela mesma: gostava de se maquiar, usava os cabelos curtos, saía às ruas sozinha, fumava, não queria casar nem ter filhos, escrevia versos que causavam impacto na intelectualidade paraibana e escrevia para os jornais.
Anayde nasceu em 1905, na capital paraibana. Se formou pela Escola Normal em 1922, com apenas 17 anos, e se destacou como primeira aluna da turma. Além de normalista, era poeta e amante das artes. Logo que se formou, passou a lecionar na colônia de pescadores perto de sua cidade de Lucena. Em 1925, ganhou um concurso de beleza. Circulava também nos meios intelectuais, onde se declarava publicamente a favor da liberdade e da autonomia feminina.
E onde entra essa moça jovem, inteligente, articulada e bela na história do Brasil?
Anayde se envolveu emocionalmente com João Dantas, advogado, jornalista, candidato republicano de oposição a João Pessoa (vice de Getúlio Vargas, até então governador da Paraíba) e de perfil conservador. Duas pessoas com ideologias contrárias, mas que não conseguiram fugir do feitiço atrativo do amor.
No meio daquela disputa eleitoral, não houve dinheiro jogado de cima de um prédio, nem acusações infundadas de “bruxaria e feitiços”. Mas houve uma invasão à casa de João Dantas. Os invasores não encontraram as armas que estavam procurando, mas não voltaram de mãos vazias. Cartas de Anayde à João Dantas, cheias de conteúdo erótico, foram espalhadas pela cidade com ajuda maciça da imprensa da época.
Com a honra manchada, João Dantas atira no peito de João Pessoa. João Dantas foi encontrado morto em sua cela. A comoção que se seguiu fez eclodir a Revolução de 30, e o resto é a história que aprendemos nos livros.
Anayde se refugiou num abrigo em Recife. Não aguentou a morte social. Se matou tomando veneno.
“Mas não me julgues por isto diferente das outras mulheres; há, em todas nós, o mesmo instinto, a mesma animalidade primitiva, desenfreada, numas, pela grosseria e desregramento dos apetites; contida, nobremente, em outras, pelas forças vitoriosas da inteligência, da vontade, superiormente dirigida pela delicadeza inata dos sentimentos ou pelo poder selético e dignificador da cultura”.
Taty Valéria