Para quebrar as barreiras que as mulheres enfrentam, impostas por décadas de machismo, algumas empresas têm criado políticas para a inserção feminina. Boazinhas? Não. É comprovado que a diversidade faz bem financeiramente a qualquer tipo de negócio.
— Nos últimos tempos, temos visto uma evolução na contratação de mulheres em empresas consideradas masculinas, principalmente multinacionais das áreas de tecnologia, engenharia e financeira. Percebe-se que esta pressão muitas vezes é externa, em função de suas sedes serem na Europa e nos Estados Unidos. Por terem políticas de diversidade e gênero mais consolidadas, essa pressão é repassada às suas filiais no Brasil e América Latina — explica Carine Roos, cofundadoras da ELAS, escola de Liderança e Desenvolvimento.
Na GE Celma, unidade de aviação da GE no Brasil, atualmente 15% de mulheres ocupam cargos que antes eram considerados masculinos.
— Nos últimos oito anos, tivemos um crescimento de 20% da contratação de mão de obra feminina em todas as áreas — explica Jaqueline Tibau, diretora de RH.
Uma delas é Renata Inácio. Com 41 anos, a operadora de reparos de motores fez parte do primeiro plano piloto de mulheres na oficina da GE Celma, em 1999.
— Claro que, no início, sentia que alguns colegas não acreditavam na minha capacidade. Mas, ao mesmo tempo, minha liderança, que era masculina, me apoiava — lembra.
Também funcionária da GE Celma, Juliana da Silva Bernstorff, de 30 anos, lembra que a mãe era contra a sua opção pela engenharia.
— Minha mãe sempre me dizia que achava que engenharia não era uma profissão de mulher, que eu deveria fazer algo ‘mais feminino’ e me dava exemplos como psicologia ou fisioterapia. Sei que ela não falava isso por mal. Ela, como a maioria das mulheres daquela geração, foi criada para ser dona de casa — diz a engenheira mecânica.
O olhar desconfiado dos colegas homens também fez parte do dia a dia da engenheira agrícola Adelina Rezende, de 24 anos, monitora de manutenção da Terra Santa Agro, na fazenda Guapirama, em Mato Grosso do Sul.
— Hoje atuo diretamente nas fazendas e na manutenção. No começo, a equipe da oficina ficou bem surpresa: não esperavam uma mulher fazendo um trabalho tão rústico. Há sempre algum receio, porque é um ambiente ainda muito masculino, e eles ficam preocupados se não irão faltar com respeito comigo. E eu também tinha receio de não ser ouvida — relata.
Em empresas de tecnologia, a presença de mulheres chega em torno de 17%, diz Silaine Stüpp, fundadora da Herforce, plataforma de divulgação de vagas e avaliação de empresas voltada para mulheres no Brasil.
— Embora este avanço esteja acontecendo, ainda temos muito a evoluir em termos de motivação e processos de implantação. Enquanto uma empresa avançar na diversidade de gênero por conta somente da pressão de investidores, mercado ou imagem, sem trabalhar o ambiente de trabalho e cultura, esta representatividade dificilmente se manterá, pois a diversidade sem a inclusão se torna apenas um número — salienta.
Para tentar mudar os números citados por Silaine, a plataforma digital do mercado imobiliário QuintoAndar lançou um curso focado em mulheres em área de TI em São Paulo. Segundo Késia Cristine, líder de recursos humanos, apesar de nas posições de liderança a empresa estar bem equilibrada na diversidade de gênero (50%/50%), a área de desenvolvimento de software ainda é similar ao mercado.
— Entendemos que contribuir com a formação dessas profissionais é uma forma de prepará-las e incentivá-las — diz Késia.
Para Nina Silva, executiva de TI e fundadora do movimento Black Money, há uma mudanças das empresas de tecnologia em relação à inclusão de gênero, mas a questão de raça ainda é muito mau discutida e aceita.
— As pessoas estranham por eu trabalhar em tecnologia, principalmente por ser uma mulher negra. Eu tenho certificações internacionais de um sistema alemão e já escutei algumas vezes: ‘você iria se dar bem na Alemanha, os gringos ficam doidos com tipos como você’. Não importanta quantos certificados eu tenho, sempre há a hipersexualização da pessoa negra — declara.
Mudanças no varejo
As lojas perceberam o fato e investem em atendimento feminino atrás do balcão. Viviane Freitas dos Santos, de 43 anos, da loja Disensa Dos Santos, contratou cinco mulheres para atuar na linha de frente com o consumidor.
— As mulheres oferecem um atendimento mais minucioso, o que impacta no aumento da compra média feita na loja — diz a dona do local, conhecida no bairro e nas proximidades como “a loja das meninas” .
Martinele de Morais Bezerra decidiu focar sua carreira no público masculino quando começou a trabalhar como assistente na rede de salões de beleza Walter’s Coiffeur. Para se especializar no ramo, a profissional se inscreveu no curso de Barbeiro Iniciante, promovido pela Walter’s Academy.
—As dificuldades que tive creio que são encontradas em todas as áreas: pelo simples fato de sermos mulheres sempre nos deparamos com alguém preconceituoso. Porém, eu batalhei muito para chegar onde estou então não me abalo com certos preconceitos. Pelo contrário, fico mais e mais forte — diz a barbeira.
Do O Globo