Adnan Ahmed, de 38 anos, postou centenas de vídeos no YouTube nos quais se gabava de fazer sexo com estranhas, horas depois de conhecê-las. Neles, Ahmed compartilha suas façanhas filmando secretamente suas abordagens de dezenas de mulheres e publicando-as na internet. Ele também aconselha homens sobre como superar a “resistência de última hora” ao sexo.
Ahmed, de Glasgow, na Escócia, conhecido como Addy A-game, faz parte de uma rede global de “artistas” de uma indústria multimilionária na qual homens ensinam outros homens a assediar mulheres.
Ahmed publicava no YouTube há dois anos, mas foi um documentário da BBC que fez com que suas atividades se tornassem amplamente conhecidas pelo público e o levou à prisão. Nesta quarta-feira (25/09), a Justiça o condenou.
A polícia agiu no início deste ano após a publicação de um vídeo feito pelo programa The Social, da BBC Escócia. Em sua defesa, Ahmed descreveu a si mesmo um “coach de namoro e estilo de vida” e insistiu que o que ele fez tinha propósitos “educativos”.
Em janeiro, o filme sobre as atividades de Ahmed viralizou, com mais de 2 milhões de visualizações. A primeira-ministra escocesa, Nicola Sturgeon, disse a um Parlamento escocês lotado que havia assistido e estava “totalmente enojada”.
Em questão de dias, mulheres compartilharam pela internet suas próprias experiências de assédio por Ahmed. Em 11 de janeiro, ele foi preso e, nove meses depois, considerado culpado de cinco acusações de comportamento ameaçador e abusivo.
O filme do programa The Social, da BBC Escócia, sobre o youtuber foi assistido mais de 2 milhões de vezes
No entanto, uma investigação da BBC Escócia descobriu que a polícia já sabia de suas atividades três meses antes da publicação do filme, depois que uma colega de faculdade o denunciou em outubro de 2018.
Rita Bruce viajou de carro com Ahmed para a Fife College, onde ambos estudavam serviços sociais. Ela diz que ver o Instagram de Ahmed a levou a seus vídeos. “Eu me senti fisicamente doente”, diz.
“Ele tem comparsas que filmam quando se aproxima de mulheres e meninas. Elas não sabem que estão sendo filmadas. Então, desde o início, é deplorável. Isso não é apenas sobre abordar mulheres, é mais sombrio. Pensei: ‘Preciso contar a alguma autoridade’. E liguei para a polícia.”
No julgamento, foi demonstrado que Ahmed abordou duas estudantes em uma rua isolada em 2016, quando elas tinham 16 e 17 anos. Segundo uma das vítimas, ele disse que ela era “bonita” e a fez se sentir “desconfortável”.
“Ele me perguntou se eu estava na escola, se eu tinha namorado, se era casada, por que estava usando um anel. Disse ‘não’ e fui embora. Então, ele pediu meu telefone e quis saber se eu queria tomar um café — eu disse que não.”
Uma mulher de 21 anos descreveu no tribunal como Ahmed a seguiu pelo centro de Glasgow em 2016. “Ele tentou me puxar para perto dele para me beijar, então, eu o empurrei. Ele colocou uma mão na minha bochecha e a outra mão nas minhas costas e me puxou.”
Uma mulher de 20 anos pensou que Ahmed estava brincando quando a abordou na rua em Glasgow, em novembro do ano passado. “Ele me elogiou e disse que eu parecia uma celebridade.” A mulher disse que se sentiu “desconfortável” e “intimidada” por Ahmed. Mais tarde, ele mandou uma mensagem no Instagram para ela, que o bloqueou. Ele então a chamou de “racista” por rejeitá-lo.
A advogada de Ahmed, Donna Armstrong, disse que seu cliente “não queria causar medo ou alamar ninguém”.
Críticas à polícia
Soube-se ainda no julgamento que, antes de Bruce, um policial de Glasgow também havia denunciado Ahmed depois de testemunhar seu comportamento “predatório”.
Enquanto isso, Ahmed continuou abordando mulheres na rua e postando material ofensivo em seu canal no YouTube. Ele se aproximou da estudante Becca, de 20 anos, em novembro do ano passado, em um ponto de ônibus.
“Eu apenas o ignorei. E, então, ele me chamou de ‘puta’. Fiquei muito desconfortável com isso. Obviamente, comecei a pensar quando ele se tornou um pouco agressivo: ‘Ele vai me seguir até dentro do ônibus? O que ele vai fazer em seguida?’.”
A BBC Escócia identificou ao menos outras seis mulheres que dizem ter sido abordadas por Ahmed depois que Rita o denunciou à polícia em 2018. Suas experiências mais tarde se tornaram parte do processo contra ele.
“Se ele foi denunciado, isso deveria ter sido levado muito mais a sério. A BBC encontrou os vídeos e outras coisas em seu YouTube — então, obviamente, não é tão difícil, se você o está investigando, ver que ele é um perigo para as mulheres”, diz Becca.
“O fato de terem permitido que ele continuasse a se comportar assim por meses é totalmente ridículo.”
Sandy Brindley, diretora-executiva da Rape Crisis Scotland, organização sem fins lucratvios dedicada a combater a violência sexual, também critica a resposta da polícia.
“Quem fez a denúncia deve ser elogiado por persistir. A polícia poderia e deveria ter agido antes. Quando agiu, fez isso bem. Mas há lições a serem aprendidas sobre como reagir mais rapidamente quando há um comportamento claramente predatório é relatado.”
A polícia da Escócia disse que uma investigação foi iniciada em janeiro, depois que foram levantadas preocupações sobre o comportamento de Ahmed em relação às mulheres.
O inspetor Mark McLennan afirma: “As mulheres de que Ahmed se aproximou foram submetidas a assédio e ficaram assustadas com sua atenção indesejada. Quero prestar homenagem à coragem dessas mulheres que se apresentaram e forneceram evidências para levar Ahmed à Justiça, principalmente porque ele parece esperar que elas tolerem seu comportamento injustificado e indesejável”.
Da BBC Brasil