Um poema incendiou o plenário da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) na tarde desta quarta-feira. Ao declamar “Sou puta, sou mulher”, da poeta Helena Ferreira, a deputada Isa Penna (PSOL) foi interrompida por Valéria Bolsonaro (PSL), repreendida pelo presidente da Casa, Cauê Macris (PSDB), e ouviu, de quebra, Douglas Garcia (PSL) prometer pedir a cassação do seu mandato.
Isa Penna havia subido à tribuna para reprovar o projeto do deputado Altair Moraes (Republicanos), que prevê o critério biológico como único princípio de seleção de jogadores em atividades esportivas, excluindo a identidade social de transgêneros na separação de equipes masculinas e femininas. Nesta tarde, esteve em votação o requerimento para que a proposta tramitasse em regime de urgência.
Após criticar deputados que não teriam, segundo ela, “nenhuma solidariedade com outras vidas humanas”, Penna recitou um poema para “tocar o coração” dos colegas.
“Sou puta. Quando uso a boca vermelha. Meu salto agulha. E meu vestido preto. Sou puta. Mordo no final do beijo. Não fico reprimindo desejo”. Os primeiros versos do poema indignaram os parlamentares, que não deixaram a oradora continuar. A deputada Valéria Bolsonaro interrompeu a fala para pedir que a colega parasse com a recitação. Cauê Macris, em seguida, pediu para que se retirassem as “expressões de baixo calão das notas taquigráficas” e que a deputada do PSOL “não usasse a tribuna da Casa nesse sentido”.
Penna tentou continuar o discurso, mas Douglas Garcia a interrompeu para afirmar que a deputada estava “envergonhando a Assembleia Legislativa” e que iria entrar com um pedido de cassação de seu mandato. O requerimento de urgência acabou aprovado pelos deputados.
Após o acirramento dos ânimos, Isa Penna disse que sua intenção foi “desnudar a hipocrisia” na Alesp com um poema que “mexeria com a família tradicional brasileira”.
“A gente está num momento em que não se trata só de combater o conservadorismo, mas valores obsoletos. E vencer a hipocrisia de uma vez por todas. Precisamos trazer a realidade e fazer o debate da realidade como ela é”, declarou a deputada.
E continuou: “Esse é um projeto transfóbico. A luta contra a transfobia é tão importante quanto a luta contra o machismo. São frutos da mesma árvore. E não vamos arredar o pé. “Boa parte desses ‘homens de bem’ são clientes de prostitutas, de travesti. É uma hipocrisia tremenda”, desabafou.
Do Globo