Da luta de Dandara contra a escravidão, passando pela trajetória de Maria Quitéria, a primeira militar brasileira, e contando, ainda, a luta da bióloga Bertha Lutz, a primeira servidora pública do país. As histórias dessas mulheres, apesar de marcantes, estão longe dos livros didáticos que a maioria dos brasileiros estudam durante a educação básica. Em uma sociedade que luta por direitos iguais para homens e mulheres, cinco adolescentes entre 17 e 18 anos criaram o aplicativo “Educativo Pioneiras”, a partir de um projeto de iniciação científica da Fundação de Ensino de Contagem (Funec), unidade situada no Centro da cidade da Grande BH.
O app por enquanto é um protótipo, mas já garantiu às jovens premiações: terceiro lugar na Feira Brasileira de Colégios de Aplicação e Escolas Técnicas (Febrat) e primeiro na Feira Mineira de Iniciação Científica (Femic). Este último evento credenciou o projeto, inclusive, para uma exposição de ciências na Cidade do México. Porém, as meninas ainda dependem de recursos e tentam consegui-los a partir de uma vaquinha disponível na internet.
O aplicativo nasceu dos esforços de cinco estudantes do 3º ano do ensino médio da Funec – Mikaele Duarte, Júlia Braga, Maria Luiza Andrade, Ana Raquel Mendes e Vitória Bispo, todas entre 17 e 18 anos. O projeto foi concebido na disciplina de sociologia, a partir do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, promovido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) em conjunto com a fundação de Contagem. “A gente inscreve um projeto de pesquisa e os estudantes recebem uma bolsa mensal de R$ 150 para desenvolver o trabalho. É um valor baixo, mas que faz toda a diferença para que se empenhem e paguem pelas coisas básicas, como livros e passagens”, explica Frederico Alves Lopes, de 30, professor de sociologia e coordenador do Educativo Pioneiras.
A ideia de criar o aplicativo nasceu da provocação de uma aluna durante a aula de sociologia. “Ela me perguntou: ‘Professor, a gente estuda muitos sociólogos. Por que você não traz sociólogas?’. Foi aí que eu conversei com a Júlia (Braga, uma das idealizadoras do projeto) e disse pra gente inscrever um projeto desse no programa de bolsas. Foi o pontapé das Pioneiras, que depois se estendeu não só para as sociólogas, mas para artistas, políticas, biólogas e outras”, ressalta o professor Frederico Alves Lopes.
A interface do aplicativo exibe uma árvore, dividida em quatro partes: as raízes, as primeiras mulheres a se tornarem referência no Brasil, nos seculos 16 e 17; o tronco, formado por personagens dos séculos 18 e 19; a copa, que exibe as mulheres que atuaram entre 1901 e a atualidade; e os frutos, que ressaltam os Direitos da Mulher garantidos pela Organização das Nações Unicas. Há, ainda, jogos interativos sobre o que foi estudado no aplicativo.
“A gente resolveu fazer uma cronologia da luta feminina em uma árvore. O usuário tem conhecimento historiográfico de várias mulheres do Brasil, coisas que geralmente não se tem no currículo escolar e acadêmico”, conta Júlia Braga, uma das estudantes à frente da iniciativa. “Quando entramos no projeto, a gente já sabia que existia o preconceito (contra a mulher), mas pudemos absorver muitas outras coisas. Isso tocou a gente de uma forma diferente. Conhecer a história delas nos motiva muito”, completa Mikaele Duarte, outra aluna envolvida no desenvolvimento do aplicativo.
Entre as personalidades exploradas pelas estudantes estão a indígena Madalena Caramuru, a primeira brasileira alfabetizada, e Ana Néri, que foi enfermeira voluntária durante a Guerra do Paraguai. Entre as figuras do mundo contemporâneo, o grupo exibe as histórias da vereadora assassinada Marielle Franco e de Maria José de Castro Rebello Mendes – primeira mulher a integrar a diplomacia do país.
“A gente quer levar conhecimento para dentro das escolas. Então, não podemos jogar no Google e a primeira biografia que aparecer usar como base (para construir o aplicativo). Senão é um copia e cola. A gente quer levar um material sólido. Então, buscamos livros para dar sustentação ao projeto”, ressalta Mikaele Duarte. A bibliografia conta com títulos como o Dicionário Mulheres do Brasil, escrito por Schuma Schumaher e Erico Vital Brazil em 2000.
O quinteto de estudantes da Funec conta com apoio de voluntários do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Cefet-MG), que ajudaram na programação do protótipo da plataforma. Além do orientador Frederico Alves Lopes, as meninas têm uma co-orientadora, a professora Adriana Mara Vasconcelos, e a tutora Érica Souza, antropóloga da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
VAQUINHA
O trabalho das estudantes as consagrou com a primeira colocação na Feira Mineira de Iniciação Científica (Femic), realizada em Mateus Leme, na Grande BH, e também foi incorporado pelo programa UFMG Jovem. A conquista na Femic deu a elas a oportunidade de participar da exposição de ciências Zamá, na Cidade do México, que ocorre em maio de 2020.
O problema é que as meninas só recebem apoio financeiro da Femic para alimentação, traslado e cinco passeios em locais turísticos do país, além da inscrição e vale-alimentação para a feira científica. Por isso, precisam arcar com as despesas de passagens e hospedagem. A alternativa? A criação de uma campanha on-line para arrecadar fundos a partir do site Vakinha. O esforço é para que o dinheiro seja levantado o quanto antes para que as passagens, por exemplo, não fiquem ainda mais caras.
Serviço
Para ajudar:
www.vakinha.com.br/vaquinha/pioneiras-no-mexico
Do Estado de Minas