E quem disse que o Brasil não tem Miss Universo em 2019?
“Esse ano significou muito para mim. Foi o ano em que comecei a participar de concursos de beleza e a entender que pessoas como eu, diferentes, podem fazer tudo o que quiserem”. A sentença, carregada de segurança e superação, mostra a essência de Milena Struck, 10 anos, vencedora de títulos infantojuvenis como Miss Distrito Federal e Miss Universo.
Apesar da pouca idade, a brasiliense, moradora do Núcleo Bandeirante, tem firmeza na fala. Sabe que a deficiência física que a acompanha desde o nascimento, uma agenesia no braço esquerdo, é apenas um desafio, não um fator limitante.
Segundo a mãe da garota, Andressa Struck, foram as competições que a ajudaram a conquistar tal confiança. “Ela demonstrou interesse nesse universo, que a faz tão bem, quando uma professora do colégio criou um programa para fortalecer a autoestima. As crianças tiveram lições de postura, etiqueta e passarela”, relembra.
Milena não hesitou em querer participar. À época, estava abalada pelos olhares indiscretos na rua e comentários maldosos de colegas de classe. Apostou que, nas atividades, acharia o afago necessário. E encontrou. “Para nossa alegria, ela se saiu muito bem e despertou paixão pelos palcos.”
Incentivada pela professora e com o apoio da família, a pequena se inscreveu no Miss Distrito Federal Infantojuvenil. No certame, era a única candidata com deficiência física. Logo em sua estreia nos concursos, alcançou o primeiro lugar.
Com a faixa da vitória atravessada no dorso, seguiu para o Miss Brasil Infantojuvenil, em Curitiba, no Paraná. Os pais, desempregados, fizeram uma vaquinha virtual para custear a viagem.
Mais uma vez, a participação de Milena arrancou elogios dos jurados e ela ganhou a primeira colocação. Foi classificada, então, para o Miss Universo Infantojuvenil, no Peru.
Os pais de menina, novamente, buscaram ajuda para pagar a jornada ao país vizinho, em setembro. “Amigos e familiares se solidarizaram. Fizeram bingo, pagaram as passagens… Nos emocionamos com tamanha mobilização”, comenta Andressa. O esforço foi recompensado com mais uma vitória, desta vez na categoria traje típico. Ela se fantasiou de Carmem Miranda, artista símbolo do Brasil.
Atualmente, a pequena representa pessoas com deficiência física em eventos sociais e governamentais. Virou porta-voz da causa.
A força da representatividade
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, no Distrito Federal, há cerca de 574 mil pessoas com alguma deficiência física, intelectual ou sensorial, o que equivale a 22% da população.
A representatividade, portanto, se mostra essencial para um caminhar inclusivo da sociedade. Quem sustenta é a psicóloga Bianca Amorim.
“Estamos em um momento em que muito se fala da prática do bullying, que nada mais é do que a violência cometida contra aqueles que representam algo que não é comum ou que os agressores julgam que não deveria ser comum”, explica.
“Ter uma miss que foge daquilo que está no imaginário coletivo nos dá o alento de que mudanças estão acontecendo”, pontua.
A mãe de Milena Struck destaca, ainda, que ninguém está imune a deficiências e que, por isso, empatia é primordial. “Todos podem ter um filho deficiente ou adquirir alguma limitação ao longo da vida. Então, seja gentil. Sempre”, conclui.
do site Metrópoles