Jogue como Duda! |
Pela ponta esquerda, Duda passa pelos marcadores como se eles não existissem. É sua posição favorita porque permite que traga a bola em diagonal para o pé direito e chute ao gol. Os dribles irritam os pais que gritam para os jogadores meninos.
Eles são superados por uma garota e aquilo seria uma vergonha. Pressionados, os garotos começam a apelar. Fazem uma, duas, três faltas.
Os pais começam a chamá-la de cai-cai.
“As mães ficam bravas porque tem uma menina dando dribles nos filhos delas”, reconhece Maria Eduarda Rodrigues da Silva, 14, a Duda, revelação da equipe do Centro Olímpico e a mais jovem convocada para período de treinos com a seleção brasileira sub-17, em novembro, na Granja Comary.
Entre todas as chamadas pela técnica Simone Jatobá, Duda era a mais jovem e de menor estatura.
“O técnico dela no Centro Olímpico me disse que tinha uma notícia extraordinária para me dar.
Depois falou que ela havia sido convocada para a seleção sub-17. Eu não acreditei”, afirma a mãe da atacante, Francesca Rodrigues.
Três ou quatro vezes por semana, elas saem de manhã de casa e mal têm tempo para almoçar após a escola antes de enfrentar até 3 horas de ônibus, trem ou metrô para chegar ao treino.
Também foi a mãe quem saiu da casa da família, na Vila Guilhermina Esperança, na zona leste da capital paulista, e foi à escola onde Duda cursa o 8º ano do ensino fundamental. Queria ter uma conversa com a professora de educação física da filha.
Duda impressionou a comissão técnica da CBF nos dez dias de treinos da seleção na Granja Comary, no Rio.
“Eles gostaram muito do foco dela. Como toda pessoa talentosa no futebol, é muito focada no que faz”, explica Rodrigo Coelho, treinador do Centro Olímpico.
Pela falta de competições nas categorias de base, o clube costuma enfrentar equipes de garotos. Com o sub-15, disputa o sub-17 do Campeonato Paulista feminino.
O Centro Olímpico caiu nas quartas de final após sofrer um gol da Ferroviária no último minuto. Duda foi a vice-artilheira da competição deste ano, com 10 anotados.
A atacante é determinada e tímida. Tanto que não sabe explicar como sofreu lesão no joelho esquerdo que a obriga a usar proteção no local e a mantém afastada do futebol. Ela está ansiosa para voltar logo porque em janeiro o Centro Olímpico disputa a Libertadores sub-14.
Duda também ficou sem palavras ao ser escolhida a melhor jogadora do Mundial sub-12 em 2017, nos Estados Unidos. Ouviu apenas chamarem o seu nome, lhe disseram algumas palavras e entregaram uma medalha.
“Eu nem sabia o que era. Não entendo inglês. Só depois me disseram que eu tinha sido eleita”, relembra.
Ela não compreendeu as palavras mas soube na hora o que significou aquele momento. Não pela premiação, mas por ter percebido que o futebol era algo de verdade na sua vida, um objetivo.
“Hoje em dia eu penso em chegar à seleção principal, ir jogar no exterior e ter uma carreira. Antes era apenas uma brincadeira”, completa.
A transformação da criança que brincava de bola para menina-prodígio do futebol feminino brasileiro foi percebida antes pela mãe.
“Acho que o momento em que ela começou a levar a sério o futebol foi na aprovação na peneira do Centro Olímpico. Ali ficou importante. Antes disso, ela mesmo dizia que futebol era apenas um hobby.”
Duda começou a jogar com o irmão Jonas, hoje com 17 anos, na quadra perto de casa. Não é só ela que pretende seguir carreira no futebol.
O irmão pratica futsal e no próximo ano vai para o Santos, afirma Francesca. Os jogos de ambos fazem com que a família não tenha outros programas de sábado e domingo além de levar os filhos em pontos diferentes de São Paulo para praticarem futebol.
Se estiver curada da contusão, Duda estará pelo Centro Olímpico na Libertadores com a camisa 4 que sempre usa. O uniforme virou uma de suas marcas porque ela chegou atrasada a uma reunião com as jogadoras do Mundial sub-12 e todas as outras escolheram o número antes dela. Só lhe sobrou o 4.
“Eu prefiro o 11”, ela reconhece.
“É, mas antes do Campeonato Paulista você me perguntou se deveria trocar para o 11 e acabou ficando com o 4 mesmo”, rebate a mãe.
Para Coelho, o número se tornou prematuramente um marketing pessoal de Duda. “É raro ver uma atacante com essa camisa. Ela é reconhecida por isso”, diz o técnico.
da Folha de São Paulo