*Milena é atendente numa empresa de call center em Campina Grande, e para trabalhar, deixava o pequeno Gabriel* com os avós paternos. Era uma dinâmica que funcionava normalmente no cotidiano, até que a pandemia do coronavírus chegou, o isolamento virou determinação, e, assim como milhares de famílias em todo o Brasil, Milena teve que se adaptar.
Por não ter sido liberada do trabalho, e em contato com outros funcionários (alguns com sintomas suspeitos do Covid-19), Milena teve que tomar a complicada decisão de abrir mão do pequeno Gabriel nesse período de isolamento. “Foi uma escolha muito difícil. Não posso deixar de trabalhar, não fui liberada para home office e não posso expor meu filho e seus avós”. Agora Milena tem que se contentar em fazer chamadas pelo Skype para aliviar a saudade e não perder contato com o filho.
Milena tem uma boa relação com o pai de Gabriel e com a família dele, isso facilita o processo. Mas infelizmente essa não é a regra.
O agravamento desse tipo de conflito levou o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) a incluir a disputa pela guarda entre os principais pontos de preocupação para a garantia dos direitos à proteção dos menores durante a pandemia.
No documento que preparou sobre o assunto, o Conanda recomendou como melhor solução, para não expor a saúde da criança e do adolescente a risco, que o menor fique somente com um dos pais, e as visitas e períodos de convivência sejam substituídos por contatos via telefone e internet. Outra alternativa sugerida seria adotar o esquema previsto para as férias, em que os filhos ficam o máximo de tempo com cada genitor, havendo menos trocas de casa.
Para Ariel de Castro Alves, ex-conselheiro do Conanda e especialista em direito da Infância e da Juventude, a suspensão temporária da troca de casas é uma medida acertada.
“As crianças e os adolescentes devem ficar preferencialmente em companhia do genitor ou genitora que esteja menos exposto ao contágio de covid-19, evitando também locais de aglomerações e os deslocamentos”, disse ele.
Primeiro, é preciso avaliar se algum dos pais integra, mora ou precisa cuidar de alguém nos principais grupos de risco – pessoas maiores de 60 anos ou com doenças crônicas, por exemplo. Nesses casos, a orientação que têm sido dada pelos advogados, em geral, é que, de fato, um dos genitores deverá suportar o cuidado integral com os filhos até o fim das medidas de isolamento.
Contudo, a advogada afirma que, se não houver exposição a grupo de risco, o ideal é que se busque assegurar o direito da criança e do adolescente à convivência com ambos os pais, mantendo-se a divisão dos cuidados. Para isso, ela diz que o melhor seria aumentar ao máximo a continuidade do tempo de permanência em cada casa.
Outra questão que se deve levar em conta é a saúde mental das crianças. Tomado os devidos cuidados, é possível manter uma convivência, mesmo que bastante reduzida. É o que tem feito *Edgard, que visita os dois filhos mas toma as precauções necessárias. “Estou em isolamento em casa, sem contato com outras pessoas. Meus filhos também estão em isolamento, tudo o que faço é ir visitar eles todos os dias, brincar um pouco e tentar passar a tranquilidade que o momento exige. Apesar da difícil relação que tenho com a mãe, ela entende que essa visita é algo terapêutico pra eles”.
Não é uma situação simples. Mais um efeito colateral social causado pelo coronavírus e que pode servir para realinhar e readequar todo um sistema. O que vale nesse momento, é proteger a saúde das nossas crianças e especialmente, proteger a saúde coletiva.
Da redação, com informações da Agência Brasil
*os nomes foram trocados para preservar a identidade da entrevistada