Maria da Penha Maia Fernandes tinha 29 anos e cursava o mestrado na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, quando conheceu Marco Antonio Heredia Viveros e começaram a namorar. Marco Antonio, colombiano, fazia pós graduação em Economia na mesma universidade. Ele era amável, educado e gentil com todos à sua volta. Dois anos depois, se casaram. A primeira filha chegou, o mestrado acabou e resolveram se mudar para Fortaleza, quando a chegada de mais duas filhas fez aquela bela família crescer. Mas a partir dali, tudo mudou.
Corria o final dos anos 70.
Até então um cara super gente boa, Marco Antonio finalmente recebeu sua cidadania brasileira e se estabilizou profissional e economicamente. A partir dali, o comportamento dele com a esposa e as filhas começou a ficar agressivo. Xingamentos, agressões verbais, explosões de raiva. Maria da Penha não queria mais viver daquele jeito, mas o que ela via na mídia não a ajudava: “Percebi que a única saída era uma separação, mas que partisse dele. Eu não podia interferir pelos exemplos que via na mídia: as mulheres que tentavam interromper o relacionamento eram assassinadas pelos companheiros”, afirmou certa vez.
Corria a madrugada do ano de 1983. Maria da Penha acordou com um barulho, tentou se mexer, mas não conseguiu. Ela havia tomado um tiro nas costas. O marido estava caído no chão da cozinha, com uma corda em seu pescoço, e afirmou que haviam sido vítimas de um assalto. A tese foi logo desfeita pela perícia. Mas a vida de Maria da Penha já não seria mais a mesma. Ela ficaria tetraplégica para o resto da vida.
Não bastasse a tragédia, e sabendo que seu marido era o autor disso tudo, Maria da Penha teve que voltar a morar com ele. Foi quando a segunda tentativa de homicídio aconteceu: Marco Antonio tentou eletrocutar a esposa no chuveiro elétrico.
Juntando as peças de um quebra-cabeça montado pelo próprio marido, Maria da Penha compreendeu todos os movimentos: ele insistiu para que a investigação sobre o suposto assalto não fosse levada adiante, fez com que ela assinasse uma procuração que o autorizava a agir em seu nome, inventou uma história trágica sobre a perda do automóvel do casal, tinha várias cópias de documentos autenticados de Maria da Penha e ainda foi descoberta a existência de uma amante.
Cientes da grave situação, a família e os amigos de Maria da Penha conseguiram dar apoio jurídico a ela e providenciaram a sua saída de casa sem que isso pudesse configurar abandono de lar; assim, não haveria o risco de perder a guarda de suas filhas.
Maria da Penha ainda sofreu, por parte da justiça brasileira, mais violências. O julgamento de Marco Antonio só aconteceu em 1991, ele foi condenado, mas saiu do Fórum andando pela porta da frente: recursos impediram que ele cumprisse pena.
O segundo julgamento só foi realizado em 1996, no qual o seu ex-marido foi condenado a 10 anos e 6 meses de prisão. Contudo, sob a alegação de irregularidades processuais por parte dos advogados de defesa, mais uma vez a sentença não foi cumprida.
Foi só em 1998, quando caso de Maria da Penha foi denunciado nos comitês de direitos humanos internacionais, o Estado brasileiro foi acusado formalmente de violação dos direitos humanos. Comitês foram criados, estudos foram feitos, e finalmente, a Justiça Brasileira foi obrigada a dar andamento célere ao caso, com toda a importância e urgência necessárias. Marco Antonio Heredia Viveros foi finalmente preso em 2002. Hoje cumpre regime semi aberto, mora num quarto de pensão, esquecido pelas filhas.
Depois do constrangimento internacional, dos grupos de mulheres e de uma batalha que já se arrastava há mais de 30 anos, o Brasil reconheceu a violência doméstica como crime. A Lei 11.340 foi sancionada em 7 de agosto de 2006.
Maria da Penha se transformou em sinônimo de luta.
- 197 (Disque Denúncia da Polícia Civil)
- 180 (Central de Atendimento à Mulher)
- 190 (Disque Denúncia da Polícia Militar – em casos de emergência)
da redação, com informações do Instituto Maria da Penha