Estuprada pelo tio, e grávida aos 10 anos de idade. Por que a vida dela não importa?

By 14 de agosto de 2020Brasil, Machismo mata

Tente ler num gole só:

Uma menina, de apenas 10 anos de idade, está grávida. Ela era violentada pelo próprio tio desde os seis anos. Após ser levada por uma tia ao hospital, a menina confirmou os abusos. Depois de um exame de sangue, a gravidez foi confirmada. Ela está no terceiro mês de gestação.

Agora vamos ao desenrolar dos fatos.

A menina é moradora de São Mateus, no Norte do Espírito Santo. O caso está sendo investigado pela Polícia Civil e ela agora está num abrigo, acompanhada pelo Conselho Tutelar. De acordo com a criança, que morava com o tio e a avó, os estupros aconteciam mediante ameaças de morte. A avó também era obrigada a manter o silêncio pelo mesmo motivo.

Pela lei vigente no país, o aborto é autorizado em casos de estupro. No entanto, a mesma lei afirma que, em casos de menores de 16 anos, a decisão fica por conta dos responsáveis, no caso, o homem que a violentava e a avó omissa. O caso foi confirmado desde o último sábado (8), mas até o presente momento, a Justiça ainda está “avaliando” a situação. O tio segue foragido.

Chama a atenção o fato da justiça ainda estar “analisando” a situação. Não há o que ser analisado. É uma criança, que não tem estrutura física e emocional para levar uma gravidez adiante. Em nota, a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos afirmou que “está atenta e acompanhando de perto todos os desdobramentos do caso” e que “vai amparar emocionalmente a criança vitimada, bem como seu bebê”. É uma aberração. A própria Damares afirmou que pretende dar total apoio à família da menina. Talvez um enxoval? Quem sabe?

Pela proposital morosidade da justiça e pelas afirmação da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente, tudo aponta para que essa menina sofra sim, mais uma violência. Ser obrigada a ter um filho do seu estuprador já é de uma crueldade indescritível. Aos 10 anos de idade, isso se torna mais que hediondo. Não existe palavra na língua portuguesa que consiga descrever a monstruosidade disso.

De acordo com um levantamento feito pela Folha de S. Paulo, 48% das interrupções legais de gravidez são realizados em meninas entre 10 e 19 anos. Quase metade de todas as interrupções de gravidez autorizadas pela justiça, foram feitas em crianças e adolescentes estupradas.

Ficou famoso um caso ocorrido em 2009, quando o arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, excomungou a mãe, os médicos e outros envolvidos na interrupção da gravidez de uma menina de 9 anos, que havia sido estuprada pelo pai, e estava grávida de gêmeos. Naquele ano, quando Brasil se encontrava em pleno uso da sua democracia, as ameaças de um religioso não surtiam o efeito de ameaça. Mesmo sendo uma decisão difícil, do ponto de vista ético e moral, a equipe médica, a família, e a justiça, fizeram o que seria menos danoso: interromper a gravidez, e garantir uma vida digna à criança.

É quase inacreditável que, 11 anos depois, o Brasil tenha recuado tanto.

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