Sete dias. Diz a lenda que em sete dias, Deus fez o mundo. Um estudo também mostra que sete dias é o período de incubação do coronavírus. E sete dias foi o período de ascensão e queda do “melhor negócio da história do Santos”. As aspas foram ditas pelo presidente do clube, Orlando Rollo, em 10 de outubro, quando o time anunciou a contratação do atacante Robinho, que estaria de volta à Vila Belmiro, com salário de R$ 1.500 por mês, até fevereiro.
Seria sim, o melhor negócio da história do clube. Só que não.
Pra quem não lembra, Robinho foi condenado na Itália a 9 anos de prisão por participar do estupro coletivo contra uma moça albanesa. Na ocasião da condenação, Robinho jogava no Istambul Basaksehir. Desde então, Robinho não pode mais voltar à Itália ou a qualquer outro país com acordo de extradição. O Brasil não está entre eles.
Logo após o anúncio da volta de Robinho ao Santos, começaram as manifestações de repúdio. Os movimentos de mulheres foram os primeiros, como sempre, mas a indignação foi além. Jornalistas esportivos, atletas e ex atletas, torcidas organizadas também se posicionaram.
Áudios do jogador em conversa com um amigo chamado Jairo, e divulgadas pelo Globo Esporte, comprovam que ele participou do estupro, e que não demostra qualquer arrependimento.
Robinho: – Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu.
Jairo: – Mas você também transou com a mulher?
Robinho: – Não, eu tentei.
Jairo: – Eu te vi quando colocava o pênis dentro da boca dela.
Robinho: – Isso não significa transar.
Após essa publicação, o próprio jogador fez questão de “vazar” um áudio. Robinho se diz tranquilo, diz que acredita em Deus, que tudo não passa de uma perseguição da Globo, diz que sofre igual ao Bolsonaro, e que vai marcar um gol em homenagem ao presidente.
E como tudo que está ruim pode piorar ainda mais, a história começou a atingir a parte que mais dói: o bolso.
A empresa de ortodontia Orthopride, que pagava ao time 2 milhões de reais por ano, desde um acordo em 2018, foi a primeira a romper. A Philco, também patrocinadora do Santos, informou em nota que “exige a rescisão imediata com o atleta” caso contrário irá revogar o contrato de patrocínio. A Kicaldo se diz contra qualquer tipo de violência e apoia a rescisão do contrato de Robinho, caso contrário, a empresa de alimentos assume o compromisso de encerrar o patrocínio com o clube paulista. Casa de Apostas soltou um comunicado, em que dizia que também não aceitava a permanência de Robinho no clube e deu até segunda-feira para que a diretoria tome uma decisão a respeito. A Foxlux também soltou nota e pede ao Santos uma definição do que será feito quanto ao assunto. A Sono Quality, patrocinadora do time feminino do Santos, espera um posicionamento da diretoria. A Brahma, que era parceira do clube até outubro e estava acertando uma renovação, interrompeu as negociações. A Umbro soltou em nota que realizará uma reunião com a diretoria do Santos para esclarecer sobre os riscos de Robinho permanecer no Santos, atualmente, a Umbro é a fornecedora de material esportivo do clube.
Sem ter mais o que fazer, nem pra onde ir, o clube do Santos cancelou o acordo com o atacante Robinho. O anúncio foi feito na noite desta sexta-feira, 16. “O Santos Futebol Clube e o atleta Robinho informam que, em comum acordo, resolveram suspender a validade do contrato firmado no último dia 10 de outubro para que o jogador possa se concentrar exclusivamente na sua defesa no processo que corre na Itália”, disse o clube em comunicado que mais parece uma bela passada de pano.
Pra começar, essa contratação nem deveria ter acontecido. Mas aconteceu, e por que? Porque o Santos está se lixando pra quem é condenado por estupro. Que o diga o técnico do time. Em julho de 1987, durante excursão do Grêmio à Europa, os jogadores Cuca (atual técnico do Santos), Henrique, Fernando e Eduardo foram presos em Berna, na Suíça, foram acusados de estuprar uma menina de apenas 13 anos. Eles ficaram 28 dias detidos. Dois anos depois, foram condenados pela Justiça daquele país, mas cumpriram a pena em liberdade. Na volta ao Brasil, foram recebidos como heróis.
O fio da história do Brasil é todo muito triste. Homens acusados de estupro, assassinato com ocultação de cadáver e sequestro, são contratados e recebido como heróis. Atletas mulheres que gritam “Fora Bolsonaro” são penalizadas. O Santos não rescindiu o contrato para que Robinho cuidasse da sua defesa, o Santos só não quis perder dinheiro. Seguindo o clichê, já sem graça, de todo abusador, Robinho é bolsominion. é tudo tão interligado que nem cabe discorrer sobre o assunto, é o que está posto.
Falando enquanto mulher, antes mesmo de ser jornalista, repito que é nossa integridade física que está em risco. Nós mulheres não temos um único lugar seguro para nos abrigar. Podemos ser silenciadas, estupradas, agredidas, ou assassinadas apenas por existirmos. Podemos e continuamos a lutar, mas é impossível fazermos isso sozinhas, especialmente quando o Presidente da República fomenta tanto ódio contra nós.
E aqui, pra encerrar, pego emprestada a fala do grande Casagrande: “Eu estou assustado com a sociedade brasileira. Não é o apedrejamento do Robinho, é o apedrejamento da moral da sociedade brasileira”.
Ele tá assustado e é homem, agora imaginem nós, mulheres?
Taty Valéria