Ter receios e medos relacionados ao processo de engravidar é normal. Grupos, chats, perfis em redes sociais dedicados à esse tema estão em alta. Mas aqui, ninguém é obrigada, e a maternidade, assim como todas as outras decisões da nossa vida, devem ser baseadas num princípio básico: nossa escolha. Mulheres que decidem não vivenciar a maternidade ainda sofrem o estigma social que nos coloca como mães acima de tudo. E quando não é apenas uma questão de decisão pessoal? E quando a simples menção ao tema faz com que alguém tenha sintomas extremos de mal-estar, inclusive físicos? O medo exacerbado de gravidez e dar à luz só foi documentado recentemente, mas tem nome: tocofobia
Ainda pouco estudado, só foi reconhecido oficialmente em janeiro de 2000, após a publicação de um estudo pelo British Journal of Psychiatry, que analisou 26 casos da fobia. O documento foi o primeiro a classificar a fobia na literatura médica. Estima-se que, atualmente, a tocofobia afete 14% das mulheres no mundo, segundo a Nordic Federation of Obstetrics and Gynecology (Federação Nórdica de Obstetrícia e Ginecologia).
No documento, a fobia é qualificada em dois graus diferentes: tocofobia primária, quando o pavor da gravidez se instaura antes mesmo da pessoa passar por uma gestação; e tocofobia secundária, que aparece após um procedimento de parto traumático.
Fernanda Lima, 40 anos, vendedora de produtos educacionais, se enquadra no primeiro grupo.
“Aos 8 anos de idade, percebi a disfuncionalidade das famílias do meu pai e mãe. Decidi ali que não queria aquele estilo de vida para mim, e um dos caminho era não casar nem ter filhos.”, diz Fernanda, que considera a pressão social um dos catalisadores da sua fobia.
“Tenho 10 anos de casamento e meus tios e tias me pressionaram para ser mãe até os 7 anos (de casamento), depois viram que não surtiria efeito e pararam de falar. A minha mãe dizia que ter filhos me ajudaria a amadurecer e resolver meus problemas psicológicos, graças a Deus não embarquei nessa loucura.”
Apesar de não ter recebido um diagnóstico clínico, Fernanda conversou com sua ginecologista, que não nomeou meu medo, mas orientou como evitar gestação indesejada. “No ano de 2020, acompanhando o perfil no Instagram Laqueaduras Sem Filhos Sim, foi que tomei consciência do termo tocofobia e ao pesquisar, vi que me define completamente”.
Fernanda também conta como convive com a tocofobia estando num relacionamento héteronormativo. “Quando se é mais jovem, se tem mais coragem, então a minha vida sexual até que era legal, mas com o passar do tempo a coragem diminui e a fobia aumenta, então quanto mais o tempo passa, mais cuidadosa me torno. Na crise dos 7 anos de casamento, esse tema era bem recorrente e as cobranças por sexo eram enormes. Então, eu sugeri o divórcio e que ele pudesse ser feliz com uma mulher mais nova e ‘animada’, meu marido abriu mão e decidiu esperar pra ver no que dá. Ele acha que é uma fase e tem fé de que a libido venha a subir mais pra frente. Espero que ele esteja certo”
Ela tem total consciência que deveria buscar ajuda psicológica, mas para Fernanda, existem outras questões que são mais urgentes e importantes. “Estou deixando a tocofobia para um momento posterior na terapia. Entendo que isso interfere negativamente na vida do meu marido, mas se eu não pensar em me proteger, ninguém vai, infelizmente é um egoísmo que salva vidas”.
da redação