Que o Congresso Nacional é um ambiente conservador, não é novidade. A novidade (nem tanto) é o alinhamento de deputadas federais com as pautas do presidente Jair Bolsonaro. Dados do Radar do Congresso mostram que, de 77 deputadas, 55 votaram a favor do governo em ao menos 50% dos projetos de interesse do Palácio do Planalto nos primeiros dois anos desta legislatura.
Coordenadora do projeto Mulheres Eleitas, realizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, mas que envolve pesquisadoras de várias instituições, a professora de ciência política da UFRJ Mayra Goulart explica que o pleito de 2018 representou uma mudança no âmbito de eleições de mulheres. Conforme explicou, até então, as mulheres eleitas tinham um forte compromisso com as pautas progressistas, mas, naquele ano, isso mudou.
A professora explica que, quando se observa a representatividade, é preciso dividir entre a representação descritiva e a substantiva. A primeira, é relativa ao espaço ocupado por uma mulher. “Só de ver um corpo feminino em um ambiente ocupado majoritariamente por homens dá um alívio”, explica.
Já a segunda, a representação substantiva, envolve os interesses que as mulheres eleitas representam. Nesta legislatura, a pesquisa observou, que, de 77 mulheres eleitas, 44 eram filiadas a partidos que orbitam em torno do bolsonarismo. “Eleger mulheres é um avanço, mas isso não significa priorização das pautas feministas”, explica Mayra.
O levantamento do Radar mostra, por exemplo, que, entre as deputadas com votações mais alinhadas com a pauta do Palácio do Planalto, estão Carla Zambelli (PSL-SP) e Major Fabiana (PSL-RJ), parlamentares bolsonaristas.
A professora pontua, ainda, que, mesmo entre as mulheres eleitas com compromissos com a pauta feminista, existe uma dificuldade de emplacar avanços justamente pelo fato de que, ser contrário a algumas propostas, como legalização do aborto, rende mais votos e mais apoio do que ser a favor”, aponta.
Pesquisadora do Grupo de Estudos de Gênero e Política (Gepô), da Universidade de São Paulo (USP), Hannah Maruci frisa que “mais da metade das mulheres eleitas está à direita no espectro político, ou seja, mais próximas à posição política do presidente”. “Quando falamos que precisamos de mais mulheres na política, estamos falando de uma questão de justiça e democracia: precisamos ter proporcionalidade entre sociedade e representantes. No entanto, é preciso que essas mulheres se posicionem pelos direitos das mulheres”, pontua.
Professora do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), Flávia Biroli pondera que existe uma diferença entre aderir a pautas do presidente, de forma genérica, e votar contra pautas de interesse das mulheres. Ela ressalta que a maioria das deputadas eleitas em 2018 é de partidos de direita ou centro-direita e, por isso, tendem a estar mais alinhadas com o presidente. Além disso, ela lembra que existe a orientação de partidos, seguidas pelos parlamentares.
Falamos sobre isso várias vezes aqui nesse portal. A questão não é apenas votar em mulheres, mas votar em mulheres que representem de fato nossas pautas. O Congresso Nacional conta hoje com 51% a mais de deputadas federais que na legislação anterior, o que na prática, não representou avanços concretos. O conservadorismo é extremamente prejudicial principalmente para as mulheres, especialmente em questões voltadas para a saúde. Então a conclusão é que pelos próximos dois anos, estaremos a mercê da sorte. E da luta.
da redação, com informações do Correio Braziliense