Embu das Artes, cidade da região metropolitana de São Paulo, apresenta um dos mais baixos índices do ranking estadual de vacinação: é o 605º entre os 645 municípios paulistas, com 41,7% da população geral imunizada com ao menos uma dose. Os valores não impediram que a prefeitura avançasse a campanha para a faixa etária acima dos 30 anos, mas relatos de moradores acusam a burocracia envolvida no processo como um fator que desmotiva a vacinação.
A influenciadora digital Alessandra Vespa, de 31 anos, divulgou na sexta-feira (16), em um perfil com mais de 21 mil seguidores no Instagram, ter sido impedida de receber a dose por problemas com o comprovante de endereço, que estava em nome do companheiro com quem mantém união estável.
“A prefeitura diz que está na frente na vacinação, mas estão sobrando vacinas de muitas pessoas que não conseguiram [se vacinar] e eles acabam abrindo novas faixas etárias”, relatou. Como as contas da casa estão todas no nome do namorado, Alessandra levou para o posto de saúde os RGs de ambos, um comprovante de residência no nome dele, uma encomenda feita pelos Correios em nome dela e a declaração de união estável do casal. Ao chegar no local, foi informada de que só poderia ser vacinada se apresentasse uma declaração de endereço com firma reconhecida no cartório.
Alessandra procurou um dos dois cartórios da cidade e descobriu, também no lugar, que só conseguiria obter a certidão na outra unidade. Segundo ela, foram gastos R$ 7 para obter o documento, fora a locomoção, o tempo gasto e também a “dor de cabeça” de reagendar a vacinação no site da secretaria de saúde.
“Eu trabalho de casa, pude tirar um tempo para resolver isso. Mas tem muita gente que trabalha fora e simplesmente não pode se dar ao luxo de ficar correndo atrás de cartório. Falta informação no site, falta orientação dos profissionais”, observou.
Denúncias recorrentes entre mulheres
Após publicar seu desabafo, Alessandra recebeu diversas mensagens de moradores de Embu das Artes que enfrentaram dificuldades semelhantes — mulheres, em sua maioria, que também não têm comprovantes de endereço em seus nomes. Ela publicou alguns dos relatos no Twitter na tarde deste domingo (18).
Uma das histórias é de Eidites dos Santos, de 70 anos. O filho, o eletricista Paulo Elias, 36 anos, agendou a vacinação da mãe e a acompanhou ao posto. Como ela também não tinha comprovante em seu nome, levou o RG, a carteirinha do SUS, uma conta endereçada ao marido e a certidão de casamento.
“Quase saímos de lá sem ela ser vacinada, porque ela não tinha comprovante no nome dela. Eu expliquei à atendente da vacinação que as contas estavam em nome do meu pai, e que ela tinha levado a certidão de casamento. Mesmo assim foi uma luta, pensei que sairíamos sem a vacina”, contou Paulo.
Após discutir com funcionários, ele disse que uma das servidoras utilizou a carteirinha do SUS para conferir o cadastro de sua mãe. Ao acessar o sistema, constatou que era, de fato, moradora da cidade e poderia se vacinar.
A lojista Priscila Novelli, de 45 anos, foi outra a relatar constrangimento com a exigência de documentos. Ela e o marido compareceram juntos ao posto de saúde, mas antes de entrar na unidade foram informados de que apenas o RG dos dois e o comprovante de endereço dele não eram o suficiente. Priscila teria de apresentar, além da certidão de casamento, documentos dos três filhos do casal.
“Tive que ligar para os meus filhos e pedir para que tirassem fotos [dos documentos] e me enviassem para confirmar que o pai deles era meu esposo”, contou. Liberada para entrar no posto após mostrar as imagens, antes de ser vacinada ela foi novamente interrogada: “Me disseram que, sem comprovante no meu nome, eu não poderia me vacinar. Tive que gritar para o primeiro atendente explicar que eu já tinha apresentado tudo”.
Prefeitura não comenta reclamações
A Prefeitura de Embu das Artes não forneceu nenhum posicionamento sobre as denúncias. Em nota, a administração afirmou aceitar como comprovante de residência carteirinhas dos postos de saúde ou “qualquer comprovação efetiva, seja extrato de banco, holerite, contrato de locação, declaração com firma reconhecida, cartões de lojas de departamento”. Nos casos em que os comprovantes são em nome de companheiros, alega aceitar certidões de casamento ou de união estável. Se não houver nenhum outro documento, afirma disponibilizar uma equipe da atenção básica para visitar a casa do morador e atualizar os dados cadastrais do sistema de saúde.