Foi lançado, na última sexta-feira (18), o Plano de Desenvolvimento para Comunidade Cigana de Sousa, no Sertão paraibano. A iniciativa, do Governo da Paraíba por meio da Gerência Executiva de Direitos Humanos da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Humano (SEDH), a partir de projeto do Ministério Público Federal (MPF), conta com apoio da Prefeitura Municipal de Sousa e Universidade Federal da Paraíba (UFPB). O plano tem por objetivo central avançar em estratégias intersetoriais para a garantia dos direitos sociais e cidadania, além da promoção da autonomia, do protagonismo e da sustentabilidade socioeconômica dos ciganos, observadas suas características culturais e dinâmicas territoriais.
O evento de lançamento ocorreu no auditório do Instituto Federal da Paraíba (IFPB), de forma híbrida, com transmissão ao vivo pelo canal da SEDH no YouTube. Participaram do evento, além de lideranças ciganas e ciganos dos quatro ranchos de Sousa, o procurador do MPF, José Godoy Bezerra de Souza, representantes da SEDH, da Secretaria de Estado da Mulher e da Diversidade Humana, da Secretaria Municipal de Ação Social, do Programa Empreender Paraíba, da Companhia Estadual Habitação Popular (Cehap), entre outros órgãos parceiros, bem como cidadãos e imprensa de Sousa.
“Esse evento é muito importante para nós. O cigano quando tem um objetivo a ser cumprido, ele vai e busca. Eu quero agradecer a vocês, por terem se deslocado da capital para vir aqui nos ouvir, ver as nossas cobranças”, declarou Francisco Vidal Pereira (Nestor Cigano). Já a outra liderança cigana presente no evento, Cícero Romão Batista (Maninho), enfatizou que o lançamento do plano é muito importante, porque está mostrando que a luta das comunidades não está sendo em vão. “Está surtindo efeito, estão chegando os frutos. Aqueles que eram esquecidos, hoje estão sendo lembrados”, disse
Sujeitos de direito – Para o procurador José Godoy, “o Estado Brasileiro e a sociedade sempre enxergam o cigano como alguém que pode ser um objeto do direito, seja da prisão, seja da política higienista, seja de tirá-lo de algum lugar. E quando o governo para pra apresentar uma política pública, ainda em formação, mas em formação com eles, eles saem dessa condição de serem constantemente objeto de direito, para serem sujeitos de direito, sujeitos de uma política pública”, ressaltou o membro do MPF.
“Essa visibilidade de estarem aqui representantes de governos para apresentar algo que será construído também com eles, é um ponto que temos de ressaltar. É que não é uma política que está sendo construída em João Pessoa, dentro de salas com ar-condicionado, para virem aqui e dizer: vamos fazer para vocês! Não é fazer para alguém, para os ciganos, é fazer com os ciganos. É algo que já cobramos há alguns anos. A primeira vez em que estive aqui foi em 2017 e nós cobrávamos isso, que os ciganos parassem de ser vistos como alguém ‘que eu vou fazer para eles’, para começarem a ser vistos como alguém ‘que faço com eles’. Os ciganos são protagonistas dos seus destinos”, acrescentou Godoy em seu discurso.
600 famílias atendidas – A secretária-executiva de estado do Desenvolvimento Humano, Denise Albuquerque, afirmou que o plano é de grande importância para a comunidade cigana da região de Sousa, que será contemplada com ações e políticas públicas que gerarão tudo que os ciganos sempre ansiaram. “São 600 famílias que serão atendidas com saúde, educação, projetos de emprego e renda, moradia. Uma ação de reconhecimento da necessidade que essa população tem e clama”, declarou.
Quatro eixos – Segundo a gerente operacional de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos da SEDH, Natasha Batusich, “o plano foi elaborado e está sendo operacionalizado graças à parceria com vários órgãos”. Está dividido em quatro eixos: O Censo Cigano e as Ações de Inclusão Social, que prevê o levantamento de dados primários acerca da população cigana como forma de identificar as características, demandas e potencialidades e assim aperfeiçoar as políticas públicas; Inclusão Produtiva, Trabalho, Emprego, Renda e Segurança Alimentar, que busca avançar na autonomia, protagonismo e sustentabilidade socioeconômica dos povos ciganos; Integração e Consolidação da Rede de Proteção Social, com ações de combate ao preconceito e valorização da cultura cigana, articulação de campanhas voltadas para o respeito à diversidade e quebra dos rótulos por parte da sociedade; e, por último, Moradia e Território, com monitoramento das ações em andamento pelo Ministério Público Federal e Defensoria Pública da União (DPU) acerca do processo de regularização fundiária.
Projeto do MPF – Em pleno século XXI, a discriminação e o preconceito ainda fazem parte da rotina de comunidades ciganas de todo o Brasil, o que não é diferente nos três ranchos localizados em Sousa. Os cerca de 2,5 mil ciganos da etnia calón também são vítimas históricas de intimidação, de falta de segurança alimentar e saneamento básico, falta de emprego, entre outros graves problemas. Foi pensando em minimizar os impactos dessa triste realidade, buscando assegurar direitos fundamentais previstos na Constituição da República, que entre os anos de 2017 e 2020 uma equipe do Ministério Público Federal na Paraíba desenvolveu o projeto Regularização Fundiária e Intermediação de Políticas Públicas aos Povos e Comunidades Tradicionais do Estado da Paraíba, cujo escopo inicial abarcou a população cigana sousense.
Além do Plano de Desenvolvimento para Comunidade Cigana de Sousa, entre as políticas implementadas pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Humano da Paraíba, com intermediação do MPF, estão: cadastramento e entrega de cartões alimentação, emissão de carteiras de identidade (RG), cadastros de pessoas físicas na Receita Federal (CPF) e carteiras de trabalho (CTPS), além de distribuição de fotografias 3×4. Foi executado ainda, por meio de parceria entre a Prefeitura Municipal de Sousa, o Grupo Verde de Agroecologia e Abelhas (GVAA) e o Instituto Federal da Paraíba (IFPB), o projeto Rancho Limpo (coleta seletiva de lixo, reciclagem, hortas e criação de animais – avicultura – nos quintais de casas dos ranchos). A iniciativa proporcionou melhorias na saúde da comunidade, segurança alimentar e em aspectos ambientais.
Também como resultado de tratativas, visando o fortalecimento do artesanato cigano para gerar emprego e renda, foram criadas a Associação de Artesanato das Mulheres Ciganas de Sousa “Rita de Cássia” e a Associação das Ciganas Artesãs do Rancho de Cima “Pedro Maia”.
Quanto a outros compromissos firmados entre a equipe do projeto e a Prefeitura Municipal estão: construção de banheiros nos ranchos, rede de esgoto, creche e praça com área de lazer dentro da comunidade, além de recuperação do Centro Calón de Desenvolvimento Integral, pavimentação de ruas dos ranchos, entre outros benefícios. A questão da regularização fundiária segue tramitando na Procuradoria da República em Sousa.
Produtos – Como resultado do projeto, foram produzidos pela Assessoria de Comunicação (Ascom) do MPF, em parceria com o gabinete do procurador José Godoy, uma cartilha virtual com orientações acerca dos direitos básicos dos ciganos, além de relatório de todas as atividades realizadas, roteiro jurídico de atuação ministerial na defesa dos direitos ciganos, bem como o documentário Povo Cigano de Sousa – O Direito em Suas Mãos, que está disponível no canal do MPF/PB no Youtube.
Ciganos na Paraíba – A Paraíba é um dos estados que mais acolhe povos ciganos no Brasil. Além dos quatro ranchos ciganos localizados em Sousa, considerados a maior comunidade estacionária de etnia Calon no nordeste brasileiro, há também comunidades fixadas de ciganos nos municípios de Condado (PB) e Patos (PB). O MPF acompanha a situação dos ciganos calons na Paraíba, pelo menos, desde a década de 90, quando foi instaurado o primeiro inquérito civil para apurar as violações aos direitos e interesses dos ciganos no estado nordestino.
Íntegra do lançamento no canal da SEDH no YouTube. ASSISTA AQUI
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