Relatório final da Transição atesta o que já sabíamos: desmonte de políticas para mulheres foi método do governo Bolsonaro

By 22 de dezembro de 2022Brasil

O projeto Paraíba Feminina entrou em atividade nos primeiros meses de 2019 e não por coincidência, foi o início do governo Bolsonaro. Desde então, faz parte de nossa rotina de publicações os desmontes nas políticas públicas para mulheres e o relatório final da Equipe de Transição do novo governo Lula veio atestar em forma de documento, o que denunciamos nesses últimos 4 anos. Leia na íntegra a parte do Relatório final da Transição, publicado nesta quinta-feira, 22.

“A dimensão do desmonte provocado pelo governo Bolsonaro nas políticas para as mulheres é a expressão de um projeto político de invisibilização e sujeição da mulher. Tal projeto começa na esfera simbólica, mas tem consequências concretas na desorganização e no esvaziamento das políticas públicas, na desidratação do orçamento, na desestruturação institucional e, consequentemente, na perda de direitos e até da própria vida das brasileiras.”

No primeiro semestre de 2022, o Brasil bateu recorde de feminicídios, registrando cerca de 700 casos no período. Em 2021, mais de 66 mil mulheres foram vítimas de estupro; mais de 230 mil brasileiras sofreram agressões físicas por violência doméstica. Os dados são do mais recente Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Embora todas as mulheres estejam expostas a essas violências, fica evidente o racismo: as mulheres negras são 67% das vítimas de feminicídios e 89% das vítimas de violência sexual.

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Essas tragédias ocorrem no mesmo compasso do desmonte das políticas de enfrentamento à violência contra a mulher. No caso do programa “Mulher Viver Sem Violência”, os principais eixos que garantiam a capacidade de execução foram retirados da legislação, desobrigando o Estado de cumpri-los. O orçamento do programa foi desidratado em 90% e a construção de Casas da Mulher Brasileira foi paralisada. O Disque 180 foi desmantelado. Esse serviço foi transferido para a Ouvidoria de Direitos Humanos e, com isso, seu papel de orientação, informação, denúncia e gestão de informação da rede de atendimento no País ficou restrito apenas a denúncias. O orçamento para esse serviço, em 2023, é de apenas R$ 6 milhões, o que implica a paralisação do Disque-180 já nos primeiros meses do novo governo.

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No governo Bolsonaro, o feminicídio foi gravemente intensificado pela flexibilização da posse e do porte do uso de armas. De 2019 a março de 2022, mais de 400 mil novas armas de fogo foram registradas no País, segundo dados da Polícia Federal. Deste total, mais de 96% estão em nome de homens e 4% em nome de mulheres. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, quando consideramos que mais da metade dos casos de violência contra as mulheres são cometidos por companheiros, ex-companheiros, pais ou padrastos e dentro de casa, podemos dizer que isso eleva tanto o grau de escala de opressão, silenciamento e repressão sobre as mulheres, como o grau de letalidade dos homens sobre elas.

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Os recursos direcionados para financiar as políticas públicas da Secretaria de Políticas para as Mulheres, de 2015 a 2022, demonstram a dinâmica orçamentária perversa iniciada em 2016, com fortes cortes no orçamento da pasta. O PLOA 2023 traz uma redução de 90% no orçamento da área quando comparado ao orçamento de 2015. O cenário trágico de desmantelamento das políticas para as mulheres também foi intensificado pela gestão irresponsável da pandemia de COVID-19. Para as trabalhadoras domésticas, a pandemia representou o aumento do risco à própria saúde, a queda na renda e a perda de direitos. Elas foram as primeiras a serem infectadas e as mais impactadas pela COVID-19.

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A formalização dos vínculos laborais dessa categoria começou a declinar após 2016, tendência agravada na pandemia. Mesmo diante do aumento da fome, da perda de renda e direitos, o MMFDH não viabilizou ação alguma para incentivar e implementar a PEC das trabalhadoras domésticas, deixando-as ainda mais desprotegidas e vulneráveis.

A fome e a insegurança alimentar também afetam desproporcionalmente mulheres, negras e negros: um em cada cinco lares chefiados por mulheres não tem o que comer no dia a dia. Nos domicílios em que a responsável é negra ou negro, a fome aumentou de 10,4% para 18%. A fome em famílias com crianças quase dobrou. Para além do aumento do desemprego generalizado, a taxa de desalento entre as mulheres é mais que o dobro do que entre os homens. A sobrecarga doméstica, as tarefas de cuidado e a falta de oferta de serviços públicos como creche prejudicam o retorno da mulher ao mercado de trabalho.

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 Ou seja, mesmo diante de um contexto de retomada econômica, se não houver políticas efetivas com recortes de gênero e raça, elas são as últimas a serem incorporadas – principalmente em postos mais precários, desvalorizados e informais.

 

Leia o Relatório final da Transição neste link

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