No dia 29 de março de 2008, Ana Carolina Oliveira perdeu a filha Isabella em um crime que entrou para a história como um dos mais chocantes do Brasil. Alexandre Nardoni, o pai, foi condenado a 31 anos de prisão — desde 2019, cumpre a pena em regime semiaberto. Anna Carolina Jatobá, a madrasta, pegou 26 anos de cadeia. Mas, desde junho, está em regime aberto.
Um documentário da Netflix irá relembrar o caso. Com estreia em 17 de agosto, “Isabella: o caso Nardoni” trará entrevistas com os avós e a mãe de Isabella. Aos 39 anos, Ana Carolina está casada e tem dois filhos: Miguel, 7, e Maria Fernanda, 3.
Por causa deles, principalmente, relutou em participar do documentário. Mas concordou para que, segundo diz, histórias de violência como a cometida contra sua filha não sejam esquecidas — e, se possível, nunca repetidas.
A seguir, trechos da entrevista concedidas por Ana Carolina Oliveira para a divulgação do documentário.
O que lhe fez participar deste documentário?
Quando o Claudio Manoel (codiretor de Isabella: O Caso Nardoni) me procurou para conversar, achei uma boa ideia inicialmente, no sentido de que é a história da minha vida, uma história que marcou e ajudou muitas pessoas. Apesar de 15 anos passados, casos de violência contra crianças ainda acontecem. Então, vi uma oportunidade de contar essa história para que a minha filha não fosse nunca esquecida, apesar de que por mim ela nunca será.
É óbvio que para as outras pessoas não é o mesmo sentimento que tenho. Mas depois liguei para o Claudio falando que achava que era muito delicado, que isso ia mexer com feridas, porque hoje isso envolve meus filhos. Tenho um filho de 7 anos que sabe que tem uma irmã mais velha, mas não sabe a realidade dos fatos. Aí, eu desisti, mas depois voltei atrás. O meu propósito em aceitar fazer parte desse projeto foi que essa história e tantas outras que não foram contadas não sejam esquecidas.
Quando você fala de outras histórias, são de crianças que também sofreram violência, mas não ganharam essa repercussão?
Exato. O que todo pai e toda mãe procuram quando perdem o filho numa tragédia é justiça. O trâmite do processo –o julgamento, a condenação– é um processo de luto pelo qual você vai passando. Ver a justiça ser feita acalma o coração. Óbvio que 15 anos depois toda aquela dor é mais branda, mas ela existe. Eu me tratei muito para chegar ao nível em que estou hoje e poder falar do assunto.
Como foi retomar esse assunto tão sensível 15 anos depois?
Falei e sempre falarei sobre o que aconteceu, mas é sempre dolorido e cutuca lembranças que a sua memória guarda lá no cantinho. A justiça foi feita, um ciclo se encerrou para mim, mas hoje fico com o meu sofrimento, a minha dor.
De alguma forma, você vê esse documentário como um fechamento?
Não acho que seja um desfecho da história, acho que ela será contada de outra forma. As pessoas, talvez, me escutem de uma forma como nunca ouviram.
Você se casou e teve dois filhos. Era algo que você esperava poder viver novamente?
Eu sempre sonhei em ser mãe de novo. Poder me casar, ter filhos, reconstruir a minha vida foi maravilhoso para eu poder seguir adiante e com o processo normal da vida, encerrar um ciclo e começar outro. Foi um conjunto de coisas que foram se reconstruindo. A minha primeira gestação após a Isabella foi a do meu filho, Miguel, que está hoje com 7 anos. Acho que ele até carregou uma carga sentimental grande nisso tudo. Mas foi maravilhoso. Depois veio a Maria Fernanda, que está agora com 3 anos. Hoje, sou feliz com os meus filhos e com a minha família. Graças a Deus, somos uma família normal –com problemas, como todos. Os meus filhos são bênçãos.
Tivemos, recentemente, a progressão para o regime aberto da Anna Carolina Jatobá. Como você se sentiu?
Não acho justo ela estar voltando para casa. Daqui a pouco, pode ser ele (Alexandre Nardoni). A minha filha nunca vai voltar para casa. Repito: a minha filha nunca vai voltar. Tenho que aceitar as decisões da Justiça do meu país porque não tenho como mudar esse curso, mas acho justo? Não, não acho. Acho que se a minha filha não volta para casa, eles também não têm que voltar.
do site Universa