O Feminismo Deu Errado
Por Priscila Werton
O movimento feminista surgiu nos Estados Unidos por volta da década de 1950, motivado pela necessidade urgente de proteger mulheres contra a violência doméstica e sexual praticada por seus maridos e agressores. Desde o início, contou com o apoio de aliados como o movimento LGBT, que oferecia refúgio às mulheres que fugiam de situações abusivas.
Com o passar do tempo, o feminismo se consolidou e abraçou novas pautas. Após as duas grandes guerras mundiais, quando as mulheres passaram a trabalhar fora de casa, a mulher branca ganhou uma independência que muitas vezes foi sustentada por outras mulheres, em especial as negras, que assumiam o cuidado doméstico e familiar nos lares brancos. Essa dinâmica evidenciou desigualdades internas que o próprio movimento deveria ter enfrentado.
Ao longo das décadas, o feminismo propôs mudanças estruturais para alcançar a equidade entre os gêneros. Contudo, em determinado momento, desviou-se do seu caminho inicial, priorizando a punição de agressores como solução central. Assim, transformou-se em um movimento que replicou tendências do sistema penal: o encarceramento desproporcional de homens negros e pobres, beneficiando certas classes sociais e tons de pele.
O feminismo, que deveria ser uma luta por justiça social para todas as mulheres, passou a funcionar protegendo mulheres brancas de classe média e alta. Essa exclusividade criou barreiras que excluem mulheres negras, Indígenas, pobres, periféricas, LGBTQIAPN+, e outras que não se encaixam no padrão, até hoje. As conquistas do movimento passaram a ser direcionadas a um grupo restrito, perpetuando racismo, desigualdade e exclusão.
As mulheres negras, que foram fundamentais no início da luta, continuam tendo seus direitos negligenciados. A lógica punitivista do feminismo tem efeitos devastadores nas famílias negras. Quando um homem negro é preso por violência doméstica, a família frequentemente perde sua principal fonte de renda. Ele, ao sair da prisão, encontra barreiras insuperáveis para se reinserir na sociedade, dando continuidade a um ciclo de pobreza e exclusão. Isso raramente ocorre em famílias brancas, onde as punições aos agressores tendem a ser mais brandas ou inexistentes.Não se trata de defender agressores, mas de questionar as consequências desse modelo carcerário. A solução apresentada – o encarceramento – muitas vezes gera novos problemas: a desestruturação familiar, a imposição de uma maternidade solo compulsória, a perda de benefícios sociais pelo passado criminal, o ciclo de pobreza e da desigualdade. Para as mulheres negras e periféricas, a promessa de justiça social tornou-se uma armadilha que aprofunda o abismo social.
Onde estão as soluções estruturais que promovem justiça social para as mulheres negras? Quem são as aliadas dessas mulheres, quando o movimento feminista atual prioriza as demandas de mulheres brancas e ignora a interseccionalidade?
As exclusões não param por aí. Mulheres lésbicas, trans e outras identidades de gênero, que foram aliadas fundamentais no início do movimento, também são marginalizadas. Mulheres Indígenas, imigrantes, ou que fogem do padrão como idosas e gordas raramente têm suas vivências incluídas nas pautas feministas.
É preciso perguntar: o objetivo do feminismo é promover mudanças sociais que garantam direitos para todas as mulheres ou reforçar a opressão de homens e famílias negras e pobres?
O feminismo, como está hoje, falhou. Mas, ainda que com falhas, infelizmente é o único movimento bem estabelecido que sobreviveu ao tempo na luta por direitos para mulheres. Apesar dos desvios e contradições, continua sendo uma força vital na busca por equidade. Penso que não devemos abandoná-lo, mas reconstruí-lo e torná-lo verdadeiramente inclusivo e comprometido com a justiça social para todas as mulheres. Somente assim o feminismo cumprirá seu propósito.
Ou essa minha defesa do movimento é apenas uma perspectiva branca e privilegiada dos fatos?
O que vocês acham?
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