Prestem atenção nesses números:
Entre 2007 e 2017, o assassinato de mulheres por arma de fogo aumentou mais dentro do que fora de casa. No período, houve um aumento de aproximadamente 30% no número de homicídios de mulheres em ambiente doméstico com disparos de arma. Do lado de fora, o crescimento das mortes de mulheres por arma de fogo foi de 17,5%.
· As mortes acidentais de crianças e adolescentes causadas por armas de fogo quase dobraram de 2016 para 2017, passando de 20 para 39 vítimas. Entre meninos e meninas de 1 a 4 anos, a quantidade de casos fatais subiu 350%, saindo de duas para nove mortes. Na faixa etária entre 5 e 9 anos, o aumento foi de 71,42% e, de 10 a 14 anos, mais 8,88% de casos foram registrados.
· No estado do Rio de Janeiro, 75% das tentativas de feminicídio e 57% das mortes são cometidas por companheiros ou ex-companheiros das vítimas. Em relação ao local, 52% das mortes e 65% das tentativas ocorrem dentro de casa. Além disso, 47,2% dos homicídios cometidos foram por armas de fogo e 9,7% por arma branca, isto é, facas e facões.
O que esses dados têm a ver com a aquela fatídica reunião ministerial? Aquela mesma, do dia 22 de abril, antes do pedido de demissão de Moro. Aquela que o presidente falou mais palavrões que meus colegas da época da 8ª série. Pois bem, segue um trecho que vai te situar:
“O que esses filha de uma égua quer, ô Weintraub, é a nossa liberdade. (…) O povo tá dentro de casa. Por isso que eu quero (…) que o povo se arme!“, afirmou. No dia seguinte, o então ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, e o ministro da Defesa, Fernando Azevedo, assinaram uma portaria interministerial que aumentou em 12 vezes o número de munições —de 50 para 600 por ano— que pode ser comprado por cada cidadão por arma. “Um bosta de um prefeito faz um bosta de um decreto, algema, e deixa todo mundo dentro de casa. Se tivesse armado, ia pra rua. (…) Assine essa portaria hoje que eu quero dar um puta de um recado pra esses bosta! Por que que eu tô armando o povo? Porque eu não quero uma ditadura!”, continuou o presidente na reunião.
De acordo com a ONG Instituto Sou da Paz, foi a quarta medida assinada por Bolsonaro naquela semana enfraquecendo o controle do armamento no país.
Nos primeiros dias de seu governo, assinou um decreto que flexibilizava a posse de armas em casa. Depois, em maio de 2019, o presidente assinou outro decreto autorizando o porte de armas para mais categorias profissionais —a medida acabou derrubada no Congresso. Somando todas essas iniciativas, o Sou da Paz calcula que Bolsonaro já tomou seis medidas para fazer valer sua vontade de armar a população.
Ainda ontem, domingo 31 de maio, Bolosnaro voltou a defender o uso de armas pela população.
A pergunta que fazemos é: ter arma em casa vai te defender de quê, exatamente? Qual o inimigo? ‘Bandidagem’, comunistas ou pessoas ideologicamente contrárias ao seu pensamento?
Armas de fogo só possuem um único objetivo: MATAR. É pra isso que são fabricadas e vendidas. Facas matam? Matam sim. Facas, garfos, colheres, copo, panela, caneta, jarro, porta, liquidificadores e quaisquer outros objetos que você tenham em casa. A diferença crucial é que só uma arma de fogo é fabricada com o intuito de matar.
Em tempos de pandemia e isolamento, com mulheres e crianças confinadas em casa com seus agressores, as palavras do presidente ganham ainda mais gravidade e aumentam consideravelmente os riscos para quem já vive num contexto de violência.
Como reação, alguns projetos correm no Congresso Nacional e também aqui na Paraíba.
Em Brasília, as deputadas federais Benedita da Silva (PT) e Talíria Petrone (PSOL); e aqui na Paraíba, a deputada estadual Estela Bezerra (PSB), apresentaram na Câmara projeto que estabelece suspensão e apreensão de posse, porte e registro de armas de fogo a denunciados, indiciados e réus em processo de violência doméstica e feminicídio, durante a pandemia provocada pelo novo coronavírus.
As mulheres e crianças precisam de proteção. É inadmissível que a legislação seja um meio para aumentar o número de mortes de mulheres e de crianças.
Na ânsia de criar um inimigo imaginário como desculpa para armar a população, Bolsonaro e seus zumbis seguidores só fomentam o ciclo de violência, e trabalham em prol da morte.
Taty Valéria, com informações do Atlas da Violência 2019, Fundação Abrinq, e El País