A repugnante história da vendedora obrigada a emagrecer pra receber todo o salário

By 14 de dezembro de 2020Vá se tratar

Já publicamos aqui todo o tipo de história, que reflete o preconceito e a intolerância que atinge todo o mundo. Mas essa história ocorrida aqui no Brasil mostra um recorte da gordofobia nas relações de trabalho, onde uma vendedora só recebia todo o salário se atingisse as metas de emagrecimento dos patrões. O sócio da loja de bijouterias que ela trabalhava deixava bilhetes em que cobrava a perda de peso da funcionária.

A vendedora passou quase um ano e meio temendo a data mais aguardada por todo trabalhador: a do pagamento. Para receber parte da remuneração, a profissional era submetida a uma situação vexatória: subir na balança e mostrar ao chefe que havia perdido peso.

O caso foi parar na Justiça. A 1ª Vara do Trabalho de Muriaé condenou o estabelecimento a pagar indenização no valor de R$ 50 mil por danos morais à ex-funcionária. A decisão foi proferida em 13 de novembro. Procurada pelo Estado de Minas, a loja informou que interpôs recurso à decisão judicial e aguarda o fim do processo para se manifestar.

Ainda muito abalada com a situação, D.L., de 37, preferiu se pronunciar por meio da advogada, Grazielle Berizonzi. A defensora conta que, para receber uma complementação salarial no valor de R$ 200 paga aos funcionários da butique mineira, sua cliente era obrigada a cumprir metas de emagrecimento estipuladas pelo patrão, que chegavam a cinco quilos por mês.

“Para atingir as tais metas, ela ficava sem comer e até vomitava algumas refeições. A proximidade da data de pagamento passou a gerar pânico, virou uma tortura. Durante o período em que trabalhou na loja, D. chegou a emagrecer, mas não foi um emagrecimento saudável. O custo à saúde mental foi muito grande”, relata a Berizonzi.

Os métodos exigidos para comprovação da perda de peso da trabalhadora eram tão rigorosos, quanto humilhantes. Fotos anexadas ao processo judicial mostram bilhetes deixados pelo chefe em que ele determina: “Favor apresentar pesagem do dia 5/6/2019 com carimbo da academia, certificando que o peso foi realizado no dia”.

Em outro recado, escrito no envelope usado para acondicionar o complemento, o gestor avisa: “Caso não tenha perdido o peso (combinado) do mês de julho, favor devolver os R$ 200″.

Um áudio gravado pela funcionária, também arrolado ao processo, registra um dos momentos em que D.L. foi constrangida a se pesar em uma balança comprada pelo patrão. Antes de subir no aparelho, a vendedora se justifica: “Eu me pesei sexta-feira. Deixa eu te mostrar a foto (da pesagem), deu 95,4 kg. (Antes), estava com 96,2 Kg. Mas, essa semana, deve dar mais, pois estou menstruada e retenho muito líquido, fico inchada”.

A vendedora então sobe na balança. Insatisfeito com os números apresentados, o chefe retruca: “Isso (a menstruação) é desculpa de peidorreiro!”. Em seguida, investiga o cotidiano de D. e se sente à vontade para questionar a frequência dela à academia. “Você está fazendo tudo direitinho? Por que naquele dia, 19h, você estava me mandando mensagem e não fez academia?”. Por fim, ameaça: ‘Vou te dar uma colher de chá dessa vez, hein? Mês que vem, se não tiver perdido….”.

“A situação chegou nesse ponto de degradação: uma funcionária foi obrigada a compartilhar com seu chefe informações íntimas, referentes ao seu ciclo menstrual, para justificar por que não atingiu o peso que ele esperava – e, assim, conseguir receber o dinheiro que lhe era devido”, observa a advogada Grazielle Berizonzi.

De acordo com a ação judicial, D.L. recebia pouco mais de um salário mínimo. Os R$ 200 eram pagos a título de complementação salarial. A funcionária trabalhou na empresa entre janeiro de 2019 e junho deste ano.

Em sua decisão, o juiz Marcelo Paes Menezes reconhece que a trabalhadora foi vítima de assédio moral e acrescenta: “Tenho que a autora foi submetida à violência psicológica extrema, de forma habitual por um período prolongado com a finalidade de desestabilizá-la emocional e profissionalmente. A ação da ré (a loja) colocava em xeque o amor próprio da obreira, ao repugnar seu próprio corpo para atender ao padrão estético do sócio da
empresa”.

 

Do Estado de Minas

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