Os inaceitáveis interesses por trás da defesa da cesárea ao invés do parto normal

By 16 de agosto de 2019Brasil

Um projeto de lei polêmico, que permite que as pacientes optem por cesáreas no SUS, foi aprovado, por 58 votos a 20, pelos deputados estaduais de São Paulo na última quarta (14), em votação no Plenário. O texto seguirá para avaliação do governador João Dória, que pode sancioná-lo ou vetá-lo.

O PL foi criticado por não prever necessidade médica para a realização do procedimento. No texto, Janaina Paschoal (PSL-SP) defende que a gestante pode optar pela cesárea a partir da 39ª semana de gestação na rede pública de São Paulo, mesmo que o médico tenha diagnosticado condições favoráveis ao parto normal.

No plenário da Assembleia Legislativa de São Paulo, deputados contrários ao projeto argumentaram que a cesárea só deve ser realizada para salvar a vida da gestante ou do bebê. Segundo deputadas da oposição, é preciso incentivar o chamado parto humanizado, com investimento em pré e pós-natal e acesso ao parto vaginal.

Por que precisamos falar sério sobre isso?

É fato que a Organização Mundial da Saúde aponta que a cesariana sem recomendação médica aumenta os riscos de infecção e complicações no parto.

É fato que o Brasil é campeão em partos cesáreos: Dados do Sinasc (Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos), de 2016, mostram que as cesáreas respondem por 55,6% do total de nascidos vivos no país. Enquanto na rede privada, 84% dos partos ocorrem via cesarianas, no SUS, a taxa é de 40%.

É fato que a violência obstétrica é mais presente em partos vaginais que acontecem na rede pública de saúde.

É fato que as campanhas pelo incentivo e pela humanização do parto normal têm dados resultados, mas elas não atingem a massa de mulheres pobres que precisam recorrer ao SUS.

O projeto é polêmico, mas ele vem para oficializar uma prática, ilegal, que vem sendo realizada há anos no Brasil, inclusive na rede pública, onde é possível “pagar por fora” uma cesariana. O acordo é feito diretamente com o profissional obstetra, que recebe entre 3 e 5 mil reais por uma cesariana na maternidade do SUS.

É pouco provável que a lei seja sancionada, mas ele joga uma luz sobre um problema grave que afeta mulheres de todas as regiões do país, e é preciso falar disso com seriedade, sem idealizações e sem corporativismo barato.

De um lado, nós temos a necessidade urgente de humanizar o parto no Brasil. Temos um contingente enorme de mulheres que passaram por traumas físicos e psicológicos durante o parto, com profissionais que insultam, agridem, negligenciam. Violência obstétrica acontece por conta e obra humana, e não há  estrutura, por melhor e mais bem aparelhada que seja,  que impeça médicos e enfermeiros de cometer violência, a não ser sua própria cultura e a condição social da paciente.

Nós também sabemos todos os riscos de uma cesariana e todos os benefícios de um parto normal, mas entre a possibilidade de sofrer uma violência durante um trabalho de parto que pode durar horas, e até mesmo dias, é preferível agendar uma cesariana e resolver a situação com menos risco de sair traumatizada do hospital.

A discussão deve ser essa: como a classe médica e a sociedade podem e devem se unir para diminuir o fosso que separa mulheres pobres e vulneráveis das mulheres que podem pagar por um atendimento decente?

Taty Valéria

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