Relatos do racismo: “Nunca aceitamos os lugares que insistem em nos colocar”

By 20 de novembro de 2019Lute como uma garota
Jô Oliveira

O 20 de novembro como o “Dia da Consciência Negra”  foi criado pelo Movimento Negro do Brasil para trazer ao nosso conhecimento quem foi Zumbi dos Palmares, mas principalmente, trazer os seus feitos quanto ao enfrentamento de um longo e sombrio período da nossa história, que  foi a escravização no nosso país. O dia de sua morte marca a nossa força, a afirmação da nossa identidade, e acima de tudo, deixa explícito que nunca aceitamos os lugares que insistem em nos colocar, se resistimos no passado com Zumbi e Dandara, resistimos hoje e resistiremos amanhã!

Este dia, como marco de luta para a população negra brasileira passa pela reflexão do nosso lugar em sociedade, mas principalmente por trazer as nossas falas/vozes e denúncias sobre a nossa realidade, e vale salientar que as fazemos diariamente, porém este é um dia que temos um pouco mais de espaço para tratar sobre nossas problemáticas, assim como acontece com o Dia Internacional das Mulher, de Indígenas e por ai vai.

Quanto aos lugares que ocupamos enquanto população negra, e em especial, como mulheres negras, é importante trazer a “ousadia” de ocupar espaços que nos são historicamente negados, a exemplo das instâncias de criação de leis, elaboração e fiscalização de políticas públicas.

Falar sobre representação política das mulheres negras no Brasil é afirmar que mesmo com 87 anos do voto feminino, que trouxe a possibilidade de votarmos e sermos votadas em nosso país, ainda estamos sub-representas no Congresso Nacional, uma vez que no último pleito eleitoral, em 2018, foram eleitas 12 deputadas federais e 01 senadora negras. O mais alarmante é que nós, mulheres negras somos 25,8% da população total do país e temos 2% de representação no legislativo federal.

Na tarde de ontem, a deputada federal Benedita da Silva, bradou, a plenos pulmões nos microfones da Câmara de Deputados que não quer e não aceita ser tratada como política de segunda categoria, isso após ela e algumas deputadas e deputados terem sofrido um ato racista praticado por um outro parlamentar no momento em que denunciavam o extermínio da juventude negra brasileira. Acessar estes lugares implica em ter estômago e nervos de aço para combater este tipo de situação, onde em tese, o respeito às liberdades devem ser preservadas e incentivadas.

A exemplo do corrido com Benedita, precisamos avaliar os desafios que temos pela frente para ampliar a presença de mulheres negras em espaços de poder, e quando se trata da política partidária e representação, o primeiro deles é ter candidatas que fujam do “perfil de candidatura” padrão, uma vez que ainda está no imaginário popular que o político é homem, branco, e acima de 50 anos de idade.

Outro desafio diz respeito as reiteradas tentativas de minimização das pautas defendidas pelas candidatas negras, pois trazemos como plataforma de atuação e intervenção política o cotidiano de violações que afetam a população negra e estão invisibilizadas nos debates . E dentre outros desafios que envolvem a vivência partidária, o financiamento de campanha é o que mais pesa, haja vista que apenas 2,41% dos recursos dos fundos dos partidos foram destinados às mulheres negras.

Como horizonte, temos que a cada passo dado outras mulheres negras se somam à luta na marcha pelo nosso direito à vida e o bem viver, ampliando a nossa participação e reverberando as vozes daquelas e daqueles que estão, historicamente, resistindo.

Vale lembrar que hoje estamos há 600 dias sem respostas sobre o silenciamento da vereadora Marielle Franco!

Jô Oliveira, mestra em Serviço Social e candidata à vereadora em Campina Grande nas eleições de 2016

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