Homem pode trocar fralda? Cuidados íntimos das crianças no centro do machismo bolsonariano

By 23 de janeiro de 2020Brasil

Quem deve realizar os cuidados íntimos das crianças? Essa pergunta tem gerado muita polêmica e chegou até mesmo à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. De autoria das deputadas estaduais Janaína Paschoal (PSL), Letícia Aguiar (PSL) e Valéria Bolsonaro (PSL) e do deputado estadual Gil Diniz (PSL), o projeto de lei 1174/2019 busca atribuir os cuidados íntimos das crianças na Educação Infantil a apenas profissionais do sexo feminino.

Essa proposta é uma pegadinha bem perigosa. O projeto até tem sentido, em se tratando dos números assustadores de crianças abusadas sexualmente, mas tudo tem um porém.

Tirar dos homens a responsabilidade pelo cuidado e higiene das crianças é mais uma forma de afastá-los da paternidade responsável e de sobrecarregar o trabalho das mães. São poucos os espaços públicos com banheiros familiares, em que os pais possam entrar pra trocar uma fralda ou limpar a criança.

No caso de profissionais, no ambiente escolar, a situação muda figura. Mas mesmo assim, existem mecanismos simples. Para Denise Mamede, psicóloga especializada em psicologia escolar e do desenvolvimento humano, do Instituto de Psicologia da USP, ter dois cuidadores seria o ideal para minimizar os riscos de abuso, tanto por homens como por mulheres. “Assim um pode observar o outro”, diz. Outra solução é ter um processo seletivo dos profissionais mais rigoroso, observando seu histórico e sua relação com a escola e as crianças. “Cortar parte dos trabalhadores não faz sentido”, diz.

Segundo Letícia Aguiar, o projeto foi uma demanda das famílias das crianças. Um grupo de mães de Araçatuba, São Paulo, procurou as parlamentares, porque elas estavam inseguras sobre a possibilidade de funcionários homens trocarem seus filhos. O objetivo da possível lei é diminuir os casos de abusos sexuais das crianças.

Questionada sobre a possibilidade de também existirem mulheres abusadoras, Letícia argumenta que o maior número de casos é de homens. E que essa medida minimizaria os abusos. Além disso, protegeria os profissionais do sexo masculino que não são abusadores, já que impediria que denúncias falsas fossem atribuídas a eles.

“É uma forma de preservar as crianças. Não é uma proposta sexista. No caso de policiais, por exemplo, um homem, não pode revistar uma mulher”. A deputada ainda ressalta que as mulheres não ficariam sobrecarregadas, já que as tarefas seriam divididas e os homens poderiam realizar as atividades pedagógicas sem problemas.

No entanto, nem todos concordam com essa proposta. A deputada Mônica Seixas, da Bancada Ativista, anexou ao projeto um texto substitutivo em que prevê que profissionais qualificados e habilitados, independente do sexo, sejam responsáveis pelos cuidados íntimos das crianças.

Segundo a parlamentar, os textos substitutivos tramitam junto com a proposta principal e o plenário pode escolher aprovar um ou outro. “Pela característica geral da nossa Assembleia Legislativa, esse projeto dificilmente seria rejeitado, por isso nós propomos uma alternativa”, afirma a deputada.

De acordo com Mônica, a introdução de profissionais homens na educação infantil é recente. “O projeto pega o medo de violência e pressupõe que todo homem pode ser abusador, sendo que não há indícios disso. Senão assim só teríamos enfermeiras e pediatras mulheres”, afirma.

O projeto 1174/2019 já foi levado à Comissão de Constituição, Justiça e Redação. Caso seja aprovado, a deputada Mônica Seixas irá recorrer à justiça, alegando que a proposta é inconstitucional, pois faz divisão sexual dos trabalhadores, atitude que é proibida pelo artigo 7º da Constituição Brasileira.

Para ela, ao excluir os homens, os cuidados das crianças sempre seriam feito por mulheres e a eles ficaria apenas a parte pedagógica, ou seja, uma medida sexista.  “O que precisa é promover uma campanha de capacitação dos profissionais. É importante ensiná-los o que é uma higienização correta para que as crianças não cheguem em casa com feridas, por exemplo.”

da redação, com a Revista Crescer

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