Médica é espancada no meio da rua após reclamar de festa em plena pandemia

By 2 de junho de 2020Machismo mata, Vá se tratar

Imagina a situação:

Você é médica, trabalha na linha de frente no combate ao coronavírus. Vive sempre no limite do stress. Depois de um plantão, e na véspera de outro, resolve tentar dormir pra recobrar as energias. Mas aí seus vizinhos resolvem fazer uma festa. O barulho é tão alto que faz vibrar os vidros da sua casa. Você liga pra polícia, as festas são recorrentes. Eles não respeitam o isolamento, e nem seu direito de descansar. Nada acontece.

Você vai até a festa reclamar. Cinco homens avançam, te espancam. Irreal?

Pois foi exatamente o que aconteceu com a médica Ticyana D’Azambujja, de 35 anos, procurou a 20ª DP (Vila Isabel) nesta segunda-feira (1) para prestar queixa por agressão. Ela contou ter sido espancada por várias pessoas no sábado (30) após, muito irritada, quebrar o vidro de um carro ao tentar dar fim a uma festa na casa vizinha ao prédio onde mora no Grajaú, Zona Norte do Rio de Janeiro.

Ticyana chegou à delegacia com uma mão engessada, a outra imobilizada e uma das pernas também. Imagens feitas na hora da confusão mostram a médica sendo levantada por um homem enquanto outro se aproxima.

Ela contou que as festas na casa vizinha são recorrentes e que ela já não aguentava mais não poder descansar na própria casa. Anestesista e intensivista, ela trabalha diretamente na linha de frente do tratamento da Covid-19 em hospitais da rede pública e privada do Rio e Niterói.

“Fazia dias que eu já não podia nem dormir mais no meu quarto, tinha que dormir na sala, estava com um colchonete. Eu tinha um plantão no sábado à noite. No dia anterior eu já tinha feito um plantão de 24 horas”, contou a médica.

Segundo ela, o som da festa é tão alto que chega a fazer vibrar os vidros do seu apartamento. Ela afirma que já se cansou de acionar a polícia por conta das festas promovidas na casa em meio à pandemia do coronavírus.

Eu já liguei inúmeras vezes para a polícia, os meus vizinhos ligaram inúmeras vezes para a polícia. A gente tentou por todas as vias legais. A gente ligou para os Bombeiros. E aí eu não aguentei mais e tentei dar um basta naquela situação. Interfonei, tentei conversar com os rapazes e, obviamente, eles não iriam parar a festa por causa daquilo. Estavam até com música ao vivo”, disse.

Sem conseguir ser atendida pelos anfitriões da festa, a médica disse ter tomado uma decisão equivocada.

“Num ato inconsequente, irracional e impensado eu quebrei o vidro de um carro que estava parado na calçada. Assim, eu pensei que pelo menos eles iriam sair e a gente poderia tentar conversar. Só que não pensei que cinco marmanjos iriam vir para tentar me matar, e foi o que aconteceu”, contou.

Ticyana disse que correu ao ver que os homens avançavam sobre ela. “Eles correram atrás de mim e falaram ‘vamos pegar aquela’, e falaram muitos palavrões. Eu saí correndo, eles me pegaram em frente ao hospital”, disse.

Toda a agressão ocorreu na mesma rua, que tem um hospital na esquina. Segundo a médica, ela chegou a ficar desacordada diante das agressões. Quando recobrou a consciência, se apavorou ao perceber que poderia ser morta

Me seguraram, me enforcaram, até que eu desmaiei. Eles me jogaram na rua, me chutaram. Quando eu acordei, eu estava uma bota em cima do meu tórax e eles falando que iriam me matar, que era para pegar o carro porque eles iriam esconder o meu corpo”, ressaltou.

Ticyana enfatizou que gritou desesperadamente por socorro, mas que ninguém ofereceu ajuda ou interveio a seu favor. A falta de empatia, para ela, foi mais cruel que a própria agressão física.

“O que mais me doeu foi ver as pessoas passando. As pessoas passavam por mim, viam o meu pedido de socorro e não fizeram absolutamente nada. Eles [os agressores] me arrastaram, me levaram de volta em frente à casa, quebraram meu joelho e pisotearam as minhas duas mãos”, destacou.

Diante da negligência de vizinhos, a médica disse ter “perdido a fé na humanidade”. Depois de ter buscado atendimento médico, ela procurou abrigo na casa do pai. Para se proteger, decidiu expor o caso.

“Eu temi muito pela minha segurança. Então, eu pensei que a forma mais inteligente de garantir a minha proteção seria expor a minha história ao máximo, para garantir a minha segurança e a do meu filhinho. Então, hoje em dia, todo muito saiba que se acontecer alguma coisa comigo, foram esses caras”, disse.

De acordo com a 20ª Delegacia de Polícia (Vila Isabel), agentes realizaram diligências para auxiliar na identificação dos criminosos.

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