Na primeira eleição municipal após o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) definir uma cota mínima de financiamento para candidaturas femininas, a chance de uma prefeita ser eleita ainda é baixa. Das 316 chapas que disputam a prefeituras de 26 capitais, apenas 55 (17,4%) são lideradas por mulheres, de acordo com levantamento feito pelo HuffPost Brasil com dados da Justiça Eleitoral. Em 3 cidades – Manaus (AM), Belém (PA) e São Luís (MA) – todos os titulares são homens.
Na Paraíba, João Pessoa, com Edilma Freire e Campina Grande, com Ana Cláudia, apresentam candidaturas majoritárias com mulheres à frente da chapa. Mas é no município do Conde, onde a prefeita Márcia Lucena concorre à reeleição, que uma candidata apresenta mais chances de chegar a vitória.
O quadro se repete de modo geral nas outras cidades. Entre todos municípios, são 2.499 candidatas à prefeitura (13%) e 4.027 (20,9%) a vice. Em 2016, eram 2.149 mulheres candidatas a prefeitas (12,9% do total) e 2.988 a vice (17,6%).
Desde 2009, a Lei Eleitoral obriga os partidos a destinar 30% das candidaturas para cada gênero, a fim de estimular a representatividade feminina. A partir de 2018, passou a ser obrigatório aplicar ao menos 30% dos recursos do Fundo Eleitoral para mulheres na disputa eleitoral, conforme decisão do TSE. Para o pleito de 2020, o valor terá de ser proporcional. Por exemplo, se o partido tiver 50% de candidaturas femininas, metade do dinheiro terá de ir para essas campanhas.
Não há regras rígidas sobre como os partidos devem aplicar essa reserva financeira. O critério é definido pela legenda de modo que a presença de uma mulher em uma chapa eleitoral, ainda que como vice, poderia ser considerada uma forma de cumprir a regra. Na prática, contudo, o protagonismo na atuação política continua sendo de um homem.
Essa estratégia foi adotada nas eleições gerais de 2018. Na época, elas eram 67 candidatas a vice-governadoras (40% do total), em comparação a 27% na disputa de 2014. Também houve um aumento da presença feminina na suplência no Senado. Subiu de 20,5% dos candidatos de primeiros suplentes em 2014 para 23,2% em 2018. No caso da segunda suplência, a alta foi de 19,2% para 29,7%, na comparação da duas últimas eleições gerais.
A escolha de mulheres para postos coadjuvantes pode explicar o recorde de 181.311 candidaturas femininas neste ano, contra 158.450 em 2016 (aumento de 14%). A decisão sobre as vagas nas chapas eleitorais é tomada pelo comando dos partidos.
Cota e candidaturas laranja
A cota de candidaturas existe desde 1995, mas na prática, muitos partidos deixavam essas vagas vazias. Ela passou a ser obrigatória desde as eleições de 2010, mas só foi cumprida pela primeira vez em 2018. Das 7.689 candidaturas aptas, 31,6% eram mulheres. Neste ano, 33,1% entre os 542.596 pedidos de registro de candidatura são de mulheres.
Mesmo em 2018, a cota só foi cumprida na análise global. Um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV) mostra que, naquele ano, em 44 das 316 coligações a regra não foi cumprida. Além disso, 8 partidos (PSD, PROS, PCB, DEM, Podemos, Solidariedade, Rede e PMN) descumpriram a norma globalmente, isolados de suas coligações. Apenas o Novo atingiu o índice sem depender de outras siglas.
Com o fim das coligações em cargos de eleição proporcional, em 2020 a cota terá de ser cumprida isoladamente por cada partido neste ano, para os cargos de vereador.
A prática de candidatas laranja, apenas para preencher a cota, também é recorrente entre as legendas. Nas eleições municipais de 2016, o TSE apontou que, entre os mais de 16 mil candidatos que tiveram votação zerada, 14.417 eram mulheres, um forte indício de que muitas delas foram inscritas no pleito apenas para que o partido pudesse burlar a lei.
Representatividade feminina na política
O objetivo tanto da cota de candidaturas quanto da financeira é aumentar a representatividade de mulheres na política. De acordo com o TSE, 52,5% do eleitorado é feminino. Os números nos cargos de poder, contudo, estão distantes desse valor. As mulheres ocupam 15% dos assentos na Câmara dos Deputados e no Senado, são 11,6% das prefeitas eleitas e 13,6% das vereadoras. Apenas uma governadora é mulher.
O Brasil ocupa o 9º lugar na lista de 11 países da América Latina, de acordo com o Atenea – Mecanismo para acelerar a participação política de mulheres na América Latina e Caribe, um levantamento da ONU Mulheres e do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).
As nações são classificadas de 0 a 100, de acordo com 40 indicadores, distribuídos em 8 dimensões, entre elas: compromisso com a igualdade, exercício de direito ao sufrágio, efetividade da lei de cotas e paridade política, poder executivo e administração pública, poder legislativo, poder judiciário e instâncias eleitorais, partidos políticos e governos locais.
Segundo a pesquisa, o Brasil apresenta um Índice de Paridade Política (IPP) de 39,5, o que o localiza à frente apenas de Chile (38,2) e Panamá (37), que estão em 10º e 11º lugar, respectivamente. O México, com índice de 66,2, lidera o ranking, seguido de Bolívia (64) e Peru (60,1).
A pior pontuação do Brasil entre os 8 indicadores é na efetividade da lei de cotas (13,3), seguida pelos compromissos institucionais brasileiros em relação à igualdade entre mulheres e homens (20).
O estudo é contundente ao apontar que, apesar da legislação prever cotas de candidaturas desde 1995 e da existência da destinação de recursos, há falhas no controle e na fiscalização, o que gera fragilidade e não traz garantias concretas da efetividade da lei.
A ONU Mulheres também chama a atenção para a reserva de candidaturas em um sistema eleitoral proporcional de listas abertas. Desta forma, segundo o estudo, não há nenhuma garantia de que as candidatas serão eleitas, mesmo quando os partidos lançam 30% de candidaturas femininas.
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