Duas mulheres foram resgatadas na zona norte do Rio de Janeiro em situação análoga à escravidão. Uma delas é uma idosa de 63 anos que foi encontrada na última segunda-feira (23) em uma casa no bairro de Abolição, na zona norte da cidade. Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT) do Rio, a mulher trabalhou por 41 anos sem receber salário e sem direito a férias. Ela foi resgatada por equipes da Operação Resgate —uma ação do MPT com órgãos federais, que ocorre desde 18 de janeiro. O foco das operações é o combate ao trabalho análogo à escravidão.
Segundo o MPT do Rio, a idosa foi encontrada dormindo em um cômodo sem energia elétrica e com os pertences armazenados em uma caixa de papelão. A mulher contou que, ao longo dos anos, trabalhou para diversos membros da mesma família e cuidou de um deles que ficou doente. No entanto, ela nunca recebeu salário, nem teve direito a férias e vínculo empregatício registrado na carteira.
De acordo com depoimento da vítima, ela começou a trabalhar para a família como doméstica, quando tinha 22 anos de idade. No tempo que a idosa passava fora da casa, recolhia latinhas na rua, mas o dinheiro que conseguia com a venda do material reciclado era recolhido pelos patrões.
Auxílio emergencial sacado
O MPT constatou também que além de manter a mulher em condições análogas à escravidão, os patrões da idosa sacaram o auxílio emergencial, no nome da vítima. A mulher contou aos agentes que entregou os documentos para a patroa, mas foi informada de que não teria direito aos valores pois os documentos estariam velhos. Em depoimento, a patroa confirmou que realizou o primeiro saque e disse que os demais valores foram sacados por outra pessoa. Um procedimento foi aberto no banco para apurar o caso.
Empregadores responderão em liberdade
Os empregadores foram autuados e podem responder em liberdade. Um inquérito será instaurado na Polícia Federal. A procuradora do MPT, Vivian Brito Mattos, responsável pelo caso, informou que vai buscar uma indenização para a vítima compatível com o período em que ela viveu em situação análoga à escravidão.
“Essa família recebeu um auto de infração. Além dessa parte administrativa, eles vão responder criminalmente, pois manter trabalhador em condições análogas à escravidão é crime e vamos buscar, além dos valores devidos, dano moral e material ao longo de todo esse período”, informou a procuradora ao UOL. Os cálculos referentes à rescisão trabalhista levam em conta apenas os últimos cinco anos. O período anterior prescreveu.
Outros casos
No dia seguinte ao resgate na idosa, uma outra mulher, de 52 anos, foi encontrada em situação semelhante. A empregada doméstica foi localizada em um imóvel no bairro de Vila Isabel, também na zona norte do Riio. Ela prestava serviço para a mesma família desde 1989. Segundo o órgão, ela não tinha folgas e, além dos serviços da casa, cuidava de uma pessoa com Alzheimer. A mulher dormia em um colchonete no chão, próximo à cama do paciente de quem ela cuidava, e guardava todos os seus pertences em um armário dentro do banheiro.
A vítima também teve o auxílio emergencial sacado, segundo a Operação Resgate, porém os patrões negaram o saque. De acordo com a procuradora Mattos, em ambos os casos as mulheres não tinham cartões nem contas bancárias. Também não tinham acesso a telefone.
Uma terceira mulher também foi identificada em condições análogas à escravidão. No entanto, ela não foi resgata pois os patrões concordaram em pagar as verbas rescisórias da vítima. A mulher trabalhava mais de 60 horas semanais e estava sem poder sair de casa há mais de 6 meses, informou o MPT. A empregadora assinou a rescisão na hora do resgate.
Mulheres resgatadas foram levadas a centros de apoio
As duas mulheres resgatadas pelo MPT foram deixadas aos cuidados de psicólogas da Cáritas Arquidiocesana, no âmbito do programa Ação Integrada, mantido pelo MPT no Rio de Janeiro em parceria com a Superintendência Regional do Trabalho. As mulheres foram hospedadas em um hotel até a obtenção de vaga no acolhimento institucional ou reinserção na família de origem. As empregadoras foram intimadas a pagar as verbas rescisórias das trabalhadoras, com prazo de 10 dias para comprovação.
“O MPT-RJ buscará uma indenização para as vítimas compatível com o período em que viveram em situação análoga à escravidão”, informou o MPT. A Operação Resgate contou com a participação da Polícia Federal (PF), da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do Ministério da Economia, do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU).
do UOL