Stress, falta de sexo e desânimo! A pandemia e a queda no número de gravidez e nascimentos

By 21 de março de 2021Lute como uma garota

Lockdown, casais em casa sem ter pra onde sair, o que sobra? Se você pensou que sobraria muito sexo e consequentemente, muitos bebês, pensou errado.

Um levantamento recente mostra que os EUA estão enfrentando a maior queda no número de nascimentos em um século e em partes da Europa o declínio é ainda mais acentuado.

“Tendo visto a gravidade da pandemia, não estou surpreso”, diz Philip N. Cohen, professor de sociologia da Universidade de Maryland, nos EUA. “Mas ainda é chocante ver algo assim acontecer em tempo real.”

Em junho do ano passado, economistas do Instituto Brookings, nos Estados Unidos, estimaram que os nascimentos nos EUA cairiam em 300 mil a meio milhão de bebês. Ao mesmo tempo, uma pesquisa sobre planos de fertilidade na Europa mostrou que 50% das pessoas na Alemanha e na França que planejaram ter um filho em 2020 iriam adiá-lo. Na Itália, 37% disseram ter abandonado totalmente a ideia.

Um relatório do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, órgão ligado ao Departamento de Saúde (equivalente ao Ministério da Saúde no Brasil) do país, indica uma queda de 8% nos nascimentos no mês de dezembro.

Os primeiros dados da Itália sugerem um declínio de 21,6% no início do ano e a Espanha está relatando sua menor taxa de natalidade desde o início dos registros — um declínio de 20%. O Brasil também registrou redução. O número de nascimentos caiu de 2.774.323, em 2019, para 2.602.946, em 2020, queda de 6,2%, segundo dados do Portal da Transparência dos Cartórios.

Nove meses após o início da pandemia, França, Coreia, Taiwan, Estônia, Letônia e Lituânia relataram números mensais de nascimentos em dezembro ou janeiro, que foram os mais baixos em mais de 20 anos.

Joshua Wilde e sua equipe do Instituto Max Planck de Pesquisa Demográfica, na Alemanha, previram esse declínio e suas pesquisas mostram que o efeito — pelo menos nos Estados Unidos — deve durar meses.

Em outubro, eles previram que até fevereiro haveria uma queda de 15,2% nos nascimentos. Agora eles veem essa queda se estendendo até agosto.

Seria a maior queda de nascimentos em mais de um século, durando mais do que o efeito da recessão de 2008 ou mesmo da Grande Depressão de 1929. “Geralmente, o que encontramos nesses tipos de recessões e pandemias é que há um declínio no nascimento e uma recuperação”, diz Wilde.

“Você poderia imaginar que quando a primeira onda terminasse, todos falariam: ‘chegou a hora de ter todos aqueles filhos que íamos ter’.” Mas desta vez é diferente. “O que estou descobrindo é uma tendência contrária. Se as pessoas estão esperando, estão esperando muito tempo.”

E algumas decidirão não ter mais filhos.

Mas e o outro lado?

Quando falamos de um casal com acesso à informação e aos meio contraceptivos, eles têm a opção. Mas isso não se aplica nas populações mais vulneráveis. A agência de saúde sexual e reprodutiva da ONU afirma que a pandemia fez com que quase 12 milhões de mulheres em 115 países perdessem o acesso aos serviços de planejamento familiar e poderia resultar em 1,4 milhão de gravidezes indesejadas.

Só na Indonésia, o governo prevê que mais meio milhão de bebês nascerão por causa da pandemia, e durante  o lockdown, o governo enviou carros pelas vilas e cidades com mensagens de alto-falantes. “Pais, por favor, controlem-se”, dizia a mensagem. “Você pode fazer sexo. Você pode se casar. Mas não engravide.”

A agência nacional de planejamento familiar do país afirma que até 10 milhões de pessoas pararam de usar anticoncepcionais porque não conseguiam acessar clínicas ou farmácias naquela época.

Então, por que a Europa e os EUA estão enfrentando uma redução no número de nascimentos?

Uma teoria para explicar isso é que as pessoas estão fazendo menos sexo. Um relatório do Instituto Kinsey da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, descobriu que 40% das pessoas pesquisadas, independentemente do sexo ou idade, relataram um declínio em sua vida sexual durante a pandemia.

Uma pesquisa menor na China produziu resultados semelhantes. No sul da Ásia, uma pesquisa não encontrou nenhum declínio. Marieke Dewitte, psicóloga e sexóloga da Universidade de Maastricht, na Holanda, diz que devemos ter cuidado para não inferir muito desses estudos.

“As pessoas reagem de maneira muito diferente à forma como essa pandemia afeta sua sexualidade e seu relacionamento”, diz ela. “Para algumas pessoas, o estresse aumenta o desejo sexual e, para outras, acaba com o desejo sexual.” O que é mais convincente é o vínculo firme e estabelecido entre a economia e os bebês.

Ao longo da história em diferentes países, a confiança econômica levou a um aumento no número de nascimentos e a incerteza ao declínio. É o caso do Brasil, por exemplo, segundo demógrafos. Fatores econômicos têm um papel primordial no aumento — ou na diminuição — da população.

Na década de 80, quando o Brasil vivia um período de hiperinflação, Estados mais ricos, com maior planejamento familiar, registraram redução no número de nascimentos. O país também tem um número significativo de gravidezes não desejadas ou planejadas. Neste sentido, o adiamento da gestação fica restrito às classes sociais mais bem informadas, dizem os demógrafos.

Na Europa, um levantamento descobriu que mulheres da Alemanha, da França e do Reino Unido que viviam nas áreas mais afetadas pela covid-19 eram mais propensas a adiar o parto.

Ao mesmo tempo, vários países mais ricos do norte da Europa que lidaram relativamente bem com a pandemia, como Holanda, Noruega, Dinamarca e Finlândia, relataram pouco ou nenhum declínio no número de nascimentos em dezembro ou janeiro.

‘Um preço alto’

Tudo isso faz parte de uma tendência muito maior para o declínio dos nascimentos — o que preocupa algumas pessoas.

No futuro, se houver menos pessoas em idade ativa, haverá menos recolhimento de contribuições para pagar aposentadorias e cuidados de saúde para os idosos que, por sua vez, estão vivendo mais.

Existem soluções para este problema — aumentar a idade para a aposentadoria, por exemplo, ou encorajar a imigração — mas ambas têm implicações políticas.

Muitos países tentaram aumentar o número de bebês nascidos com pouco sucesso. Quando as taxas de natalidade diminuem, é extremamente difícil convencer as mulheres a ter mais bebês. Erradas elas não estão.

“Depois da grande recessão de 2009, pode ter havido alguma recuperação, mas não voltou ao nível de antes”, diz Cohen. “Certamente, nos Estados Unidos, as taxas de fertilidade nunca se recuperaram dos níveis anteriores à recessão.”

Num contexto em que as mulheres se tornaram as principais responsáveis pelos cuidados com a casa, com as crianças e com os doentes; em que somam o maior contingente de desempregados, e com a economia em seu pior momento, não é de se admirar que as mulheres não queiram ter filhos.

O mundo que lute.

da redação, com informações da BBC Brasil

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