Menguele ou Meneghel? Xuxa defende que prisioneiros virem cobaias de experimentos: “serviriam para alguma coisa antes de morrer”

By 27 de março de 2021Especiais, Vá se tratar

Durante uma live da Assembleia Legislativa do Rio, na noite de sexta-feira (26), Xuxa Meneghel  falava sobre o direito dos animais e como a prática de testagem de cosméticos e medicamentos animais pode ser cruel.  Sim, é cruel, e ninguém discute isso. Porém a apresentadora errou o tom.

“Na minha opinião, existem muitas pessoas que fizeram muitas coisas erradas e estão aí pagando seus erros para sempre em prisões, que poderiam ajudar nesses casos aí, de pessoas para experimentos”, opinou.

“Pelo menos eles serviriam para alguma coisa antes de morrer, para ajudar a salvar vidas com remédios e com tudo. Aí vem o pessoal dos Direitos Humanos e dizer que não podem ser usados. Mas se são pessoas que está provado que irão passar sessenta, cinquenta anos na cadeia e que irão morrer lá, acho que poderiam usar ao menos um pouco da vidas delas para ajudar outras pessoas. Provando remédios, vacinas, provando tudo nessas pessoas”, acrescentou Xuxa.

Por onde começar?

Em primeiro lugar, de acordo com o Código Penal vigente no Brasil, nenhum ser humano pode passar mais de 30 anos num presídio. Se a lei está equivocada e criminosos condenados deveriam cumprir prisão perpétua, ou mesmo a pena de morte, é outra discussão.

Em algum momento da história da humanidade, seres humanos foram usados como cobaias para experiências científicas. Foi na Segunda Guerra Mundial, quando judeus, ciganos, e qualquer minoria considerada “indesejada” serviu para com propósitos “científicos”. Mulheres africanas negras e pobres também serviram de cobaia para experiências no campo da ginecologia. Negros americanos pobres também serviram de cobaias humanas para vacinas contra a sífilis e foram infectados com a doença de forma proposital, sem consentimento, e sem ter a menor ideia das consequências.

Também é importante fazer um recorte sociológico. De acordo com o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), o número total de presos e monitorados eletronicamente do sistema penitenciário brasileiro é de 759.518 pessoas. Desse total, cerca de 33% ainda aguardam julgamento, o que significa que cerca de 250.800 pessoas estão presas sem ter sido condenadas.

Outro recorte importante de mencionar é que 66% da população carcerária no Brasil é formada por negros autodeclarados, e o aumento dos jovens negros em presídios cresceu 14% nos últimos 15 anos, enquanto os encarcerados brancos caiu 19%. Esses números não são coincidências do destino.

Que tipo de preso, exatamente, a Xuxa estava sugerindo para se tornarem cobaias de testes de medicamentos? Ela tentou se desculpar, veja o vídeo abaixo:

As palavras foram bem colocadas, mas apontou outro equívoco que induz ao erro. Os presídios não estão cheios de estupradores, pelo contrário. De acordo com o Anuário de Segurança Pública publicado em outubro de 2019, no ranking dos crimes está o tráfico de drogas, e associação ao tráfico. Importante lembrar que ser preso por esses crimes está muito mais ligado à cor e classe social, do que propriamente ao montante apreendido.

Após o tráfico, seguem roubo qualificado, homicídio qualificado e furto simples – que nesse caso, se incluem tentar furtar um shampoo num supermercado.

Então, não, as cadeias não estão cheias de estupradores. Até porque, esse crime tem índice de subnotificação que chega aos 70%.

Xuxa foi apenas mal informada ou equivocada e deixou transparecer sua ignorância? Ou ela apenas expressou o que realmente sente? Isso só o tempo irá nos dizer.

 

 

 

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