Divórcio na prática: 9 coisas importantes se você está planejando se separar

Amor. Projetos em comum. Desejo de constituir família. Golpe do baú. Seja qual o for o motivo, casamento e/ou união estável nada mais é do que um contrato social que envolve fatores financeiros, de moradia e de cuidados com filhos (quando é o caso). Por isso, falar em divórcio também vai muito além do término de uma relação e passa por diversas questões práticas. Apesar de ser um processo doloroso e desgastante, é essencial pensar nesses fatores e evitar ficar em situação vulnerável, principalmente quando se é mulher.

O divórcio é permitido no Brasil desde 1977, mas mesmo depois de mais de 40 anos, o assunto ainda é um tabu para muitas pessoas. Para a advogada e especialista em direito das famílias e das mulheres, Bruna Sillos, o processo de divórcio traz uma carga histórica muito negativa principalmente para mulheres. E é especialmente por isso que muitas delas desistem do processo, seja por não dar conta da carga emocional ou por não suportar o estigma da “mulher divorciada” (infelizmente, ainda muito presente).

“Anos atrás a mulher divorciada era estigmatizada e havia poucas possibilidades de reconstruir a vida profissional e social”, afirma Bruna. Essa carga histórica ainda pesa hoje em dia e faz a mulher refletir sobre isso muito antes de sair de uma relação, até quando não é saudável, considera a advogada. “Há uma ideia imposta de transformar o parceiro numa pessoa melhor. Muitas vezes, não é somente o financeiro ou o emocional que segura a relação, mas também o estigma e visão da sociedade”.

Então, se você está pensando em se separar, listamos aqui tudo que é preciso saber para se organizar.

O tempo entre decidir e agir

Bruna Sillos explica que o tempo necessário para essa preparação é muito subjetivo e pessoal, variando de caso para caso. Uma mulher que tem o costume de organizar e guardar todos os seus documentos e gastos, levaria menos tempo para o processo.

“Se for uma relação nebulosa, é bom a pessoa ter a documentação previamente separada de alguma forma, tornando possível uma saída quase que imediata do relacionamento”, explica.

Há outros casos em que a mulher é ‘pega de surpresa’ com o desejo ou necessidade de se separar e, sem um planejamento prévio, é difícil delimitar quanto tempo o processo levará. Por isso, é essencial ter uma rede de apoio fortalecida que possa acolher em momentos de urgência.

No que pensar antes de pedir a separação?

A advogada destaca que o ponto mais importante ao se “preparar” para a separação é juntar toda a documentação de bens: casas, apartamentos e outros imóveis, de possíveis ativos financeiros, como contas conjuntas ou investimentos, e carros.

“Se tiver filhos, também deve juntar documentos que comprovem seus gastos, porque há questões de alimentação, saúde, educação, lazer, vestuário e transporte”.

Alguns desses documentos seriam a certidão de casamento atualizada (90 dias), documentos pessoais dos filhos, dados de conta bancária própria para recebimento de pensão, relação de testemunhas, endereço completo da parte contrária, certidão de matrícula de imóveis, documentos de veículos, extratos de ações, contratos sociais de empresas e notas fiscais de bens e joias.

Além disso, é bom já fazer um planejamento de onde irá morar, até porque a disputa por bens pode demorar. Você pode ficar na casa de alguma amiga ou parente? Tem outro imóvel para onde poderia ir?

Também é necessário pontuar que em todos os casos de separação, antes de falar com o(a) companheiro(a), deve-se procurar um advogado para traçar a estratégia jurídica. Nos casos de dependência financeira, o judiciário não prevê nenhum benefício ou ajuda, por isso ter uma rede de apoio fortalecida pode auxiliar até entrar com um pedido de pensão (explicamos melhor abaixo). Se possível, busque um trabalho ou faça uma reserva financeira antes de pedir o divórcio.

Por fim, caso a mulher tenha condições, procure um acompanhamento psicológico.

Quem fica na casa?

A questão da posse do imóvel vai ser decidida na divisão dos bens (ver abaixo), mas antes de chegar nessa etapa, pode acontecer de ser necessário decidir quem fica e quem sai de casa.

Num primeiro momento, isso deve ser negociado. Caso não haja acordo, vai para a justiça. Bruna destaca que as chances de permanecer na casa onde o casal vivia são maiores quando se tem a guarda dos filhos.

Também há situações mais específicas como o da violência doméstica e, nessas situações, a mulher além da medida protetiva pode pedir o chamado afastamento do lar, que implica na saída da outra pessoa do imóvel. Em divórcios sem violência, é possível pedir a separação de corpos, onde um dos cônjuges deverá deixar o lar.

Quanto custa um divórcio?

O custo do divórcio é diretamente proporcional ao patrimônio do casal, portanto, quanto mais bens e dinheiro envolvidos, maior será o gasto. Esses valores envolvem os honorários do advogado, as custas do judiciário e eventuais despesas processuais, como uma perícia. Além disso, ao final do processo também deverão ser pagas as taxas do cartório.

Se a mulher estiver desempregada poderá solicitar o benefício da justiça gratuita para não pagar as taxas referentes ao processo.

Também é importante destacar que todo processo de divórcio precisa de advogado. Quem não tem condições de pagar, pode recorrer à Defensoria Pública, que oferece assessoria jurídica gratuita.

Judiciário ou cartório?

O divórcio pode ser feito tanto em cartório quanto na justiça. No cartório, existe a vantagem de ser mais rápido e eficiente, com toda a situação se resolvendo em pouco tempo. Mas o casal tem de estar 100% de acordo e não pode ter filhos menores de idade. Nesses casos, basta ir ao cartório com a advogada e documentos, onde tudo é conferido e é lavrada a escritura de divórcio.

Agora, se houver filhos menores de idade, a separação vai ter que acontecer no judiciário. Em um divórcio litigioso, o caminho é sempre o judicial. Isso ocorre quando o casal não concorda em tudo, como a separação dos bens ou também a questão da guarda dos filhos.

Existe ainda uma forma menos comum de divórcio, mas que acaba sendo a solução para algumas mulheres em determinadas situações, é o divórcio unilateral. Nessa modalidade, a mulher pede que o judiciário “substitua a vontade da outra parte” para se divorciar. Ele é diferente do litigioso, onde ambos aceitaram se separar, mas não estão de acordo sobre os termos da separação. No unilateral, somente um dos dois aceita se divorciar. Ele pode ser usado tanto quando o homem não quer a separação, quanto em casos em que ele some ou foge, por exemplo.

Quando a mulher tem direito à pensão?

É importante entender que a pensão alimentícia paga aos filhos é diferente da pensão paga à mulher. A dos filhos é determinada depois da decisão da guarda das crianças e é obrigatória.

Onde a criança irá passar a maior parte de seu tempo e de seus dias, será estabelecido como lar de referência. O genitor, geralmente a mãe, do lar de referência, será responsável pela maior parte das despesas do filho e, por isso, terá direito a uma pensão para auxiliar em custos com alimentos, saúde, educação, lazer e vestuário. O valor será definido de acordo com as necessidades dos filhos e vai até o término da universidade deles.

Quando o pai ou mãe responsável por pagar a pensão tem emprego formal, ela é deduzida direto da folha de pagamento. Mesmo em casos de desemprego, o pai terá que pagar.

Já a pensão paga à mulher é menos comum. Em linhas gerais, a advogada Bruna Sillos explica que o judiciário brasileiro tem sido muito resistente em liberar a pensão para mulheres, dificultando a questão financeira. Ocorre apenas quando é uma mulher mais velha, ou que tenha alguma doença ou então tenha ficado muito tempo fora do mercado de trabalho para cuidar da família, segundo Bruna, “e realmente não consiga trabalhar e se reinserir no mercado”.

Guarda dos filhos

A guarda dos filhos sempre é uma responsabilidade conjunta do casal, mas em diferentes níveis. A lei estabelece como padrão a guarda compartilhada, sem determinar um número pré-definido de visitas ou de valor para pensão. Há também a guarda unilateral, mas é uma exceção e acontece quando há um conflito ou impossibilidade de comunicação e convivência, pela distância, por exemplo.

Em casos de guarda compartilhada será estabelecido um número de visitas e convivência, podendo ser aos finais de semana, a cada 15 dias ou, então, metade da semana na casa de cada um dos genitores, não há uma regra e isso é negociado e decidido pela justiça.

Existe ainda um formato de guarda pouco comum que é o aninhamento: quando os filhos ficam na casa e os pais se revezam na moradia.

E a separação de bens, como funciona?

A divisão dos bens, em geral, está relacionada ao regime do casamento: separação, comunhão parcial ou universal dos bens. Pela lei, quando não há qualquer especificação sobre a partilha, a lei define como “padrão” a comunhão parcial de bens.

Comunhão parcial de bens: Nessa situação os bens são divididos pela metade entre o casal, com exceção de heranças, doações e bens adquiridos antes do casamento. Isso quer dizer que se a esposa comprou uma casa antes de casar, o imóvel não entra no bolo da divisão. Agora, caso o casal tenha feito melhorias ou reformas no local, só o valor das benfeitorias (definidos por perícia ou laudo técnico) serão divididos.

Entram na partilha de bens todos os outros ativos do casal, inclusive o FGTS e eventuais dívidas, mesmo que estejam no nome de apenas uma das pessoas. Uma dica da advogada é já pensar no casamento com a separação total de bens em determinados casos. “Quando se observa que [o outro] não tem uma vida regrada, há gastos exagerados, é uma maneira de se proteger de uma má gestão dos recursos”.

Se, depois do divórcio e da divisão de bens, for descoberto um patrimônio que foi ocultado durante o processo no judiciário, é possível solicitar novos procedimentos para outra divisão.

Separação de bens: Cada um fica com o que está no seu nome e não faz diferença se o bem foi adquirido antes ou depois da união.

Comunhão universal de bens: Tudo, inclusive o que foi adquirido antes do casamento, é dividido pela metade entre o casal. A exceção são os bens especificados em escritura pública de pacto pré-nupcial.

E a união estável?

A união estável, ao contrário do que muitas pessoas podem pensar, também acarreta em uma série de deveres e direitos, inclusive a comunhão de bens.

Apesar da inexistência de documentos e certidões de casamento, a união estável se formaliza pela existência de uma relação duradoura e pública, onde o casal está junto e tem a vontade de formar uma família. Legalmente, entretanto, não existe nenhum documento que comprove isso.

Apesar de ser um conceito bastante subjetivo, a “vontade de formar família” é entendida pelo judiciário brasileiro quando há uma troca e união entre as famílias do casal. Entre outras coisas, eles se acompanham em consultas médicas, moram juntos e efetivamente possuem uma rotina compartilhada.

Quando uma relação duradoura, pública e estável chega ao fim, é necessário fazer uma dissolução da união, em vez de um divórcio. Nesse caso, acontece a divisão dos bens do casal na concepção de uma comunhão parcial de bens, com os mesmos deveres e direitos de todo casamento, mesmo que não formalizado.

É possível ainda fazer um contrato de união estável em cartório, especificando o modelo de comunhão do casal.

Traição

A pessoa que traiu a outra não tem direito de pedir pensão e perde o direito ao sobrenome da pessoa traída. Dependendo do caso, é possível pedir danos morais, se foi uma traição pública e constrangedora.

Toda e qualquer situação de traição deverá ser comprovada na Justiça e, para isso, são aceitas como provas: prints, fotos, compras em cartão de crédito, que podem comprovar uma traição, e testemunhas. Para pedido de danos morais também é necessário demonstrar um efeito público negativo na honra da pessoa traída.

A traição não interfere na questão da guarda ou visita aos filhos. Bruna Sillos explica que no passado já houve uma discussão em torno da “culpa” de quem traiu, mas que hoje se entende o divórcio como um direito e a culpa não se estende para a relação com os filhos.

Violência contra a mulher

A advogada ressalta que todas as situações descritas acima são resultados de um divórcio em um relacionamento sem violência. Mas a separação pode vir acompanhada da Lei Maria da Penha nos casos de violência.

Nesses contextos, ocorrem dois processos separados, um na vara cível e outro na vara criminal, e há a necessidade de uma medida protetiva e o homem pode até perder o direito de visitar os filhos, bem como um eventual pedido de pensão de alimentos para a vítima.

Ainda é possível um pedido de indenização por violência, com um terceiro tipo de processo. A advogada lembra da urgência nas separações onde há violência e, por isso, a mulher, muitas vezes, não consegue se organizar com antecedência e se preparar para o divórcio, infelizmente.

 

da redação, com informações do portal AzMina

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