Em casos notificados, ao menos 19 mulheres foram atacadas com faca no Brasil numa só semana

By 16 de dezembro de 2021Brasil, Justiça, Machismo mata

Apenas na última semana, elas foram vítimas de crimes de violência de gênero com arma branca

 

Um levantamento realizado por Marie Claire identificou que em apenas uma semana, ao menos 19 mulheres foram atacadas com faca no Brasil. Os dados correspondem ao período de 6 a 13 de dezembro. Caroline AbreuMondiléia Andrade dos SantosKatia DuarteMaria da Silva Ciloi RodriguesJennifer Sabrina de Oliveira e Franciele Robert da Silva são algumas das mulheres que são violentadas diariamente no Brasil e, na pior das hipóteses, têm seus sonhos e vida interrompidas por questões de machismo e misoginia.

Os números estarrecedores corroboram com levantamento divulgado na última semana pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública que apontaram para o maior número de feminicídios ocorridos entre os meses de janeiro e junho desde o ano de 2017. Os casos de estupro também aumentaram em relação ao mesmo período do ano anterior.

O levantamento identificou casos de mulheres esfaqueadas em dez diferentes estados e em quatro regiões, com exceção do Norte.

Para a diretora-executiva do Fórum, Samira Bueno, o alto número de crimes utilizando a faca, que é considerada uma arma branca, está diretamente relacionado à autoria do crime. Ela também fez questão de frisar que apesar dos números serem altos, ainda existe muita subnotificação sobre esse tipo de crime no Brasil.

“Hoje 80% da autoria desses crimes é de um companheiro íntimo das mulheres. Essa violência muitas vezes acontece dentro de casa, então em casos de violência doméstica o agressor usa o que encontrar na sua frente para agredir a mulher”, relata.

Segundo ela, nesse tipo de crime, é comum que haja uma escalada de violência que se encerra no crime com a arma branca.

“Esse crime é diferente dos demais homicídios que acontecem com arma de fogo. É também muito comum um comportamento de escalada da violência, no dia anterior é um travesseiro, um cadarço de tênis e depois chega na faca”, explica.

A deputada estadual Isa Penna (PSOL-SP), que atua pela defesa da vida e direitos das mulheres, também apontou para um traço de machismo e misoginia que está associado à utilização de armas brancas nesse tipo de crime. “A arma branca geralmente é utilizada quando o agressor quer desfigurar a vítima.”

Apesar de o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2021 apontar que 55% dos feminicídios no Brasil acontecem com a utilização de armas brancas, Bueno apontou que uma possível mudança na característica desses crimes pode estar em curso.

Ela apontou as diversas flexibilizações impostas pelo presidente da República para acesso à armas de fogo como um fator que pode antecipar o feminicídio, que é o último estágio de um ciclo de violência doméstica.

“Até pouco tempo atrás o acesso a armas de fogo era bastante restrito, mas agora vem sendo flexibilizado. Leva tempo até essas armas chegarem nas mãos de todo mundo, mas flexibilizar o acesso significa antecipar o desfecho mais trágico do ciclo de violência contra a mulher. O ciclo vai se tornando cada vez mais violento e quando tem uma arma de fogo ela é mais letal. Com acesso facilitado existe a chance de usar antecipadamente e a política de liberação de armas pode causar um impacto de crescimento no número de feminicídios”.

Marie Claire solicitou informações sobre o números de crimes com facas e armas brancas contra mulheres nos últimos anos para o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP). O STJ não retornou as tentativas de contato, enquanto TJSP e SSP-SP afirmaram não possuir o número do recorte dessa tipificação de crime.

Aumento de estupros e feminicídios

Um levantamento divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública na última sexta-feira (10) apontou que os registros de feminicídio no primeiro semestre de 2021 foram os maiores da série histórica iniciada em 2017.

O número de estupros também apresentou uma alta de 8,3% em relação ao primeiro semestre do ano anterior. Foram 26.709 registros neste ano e 24.664 em 2020. Apenas no estado de São Paulo, de acordo com dados da SSP-SP, foram registrados 117 feminicídios e 8.839 casos de estupro consumados entre os meses de janeiro e outubro de 2021.

Mesmo indicando para um aumento no número de casos, Samira Bueno destaca que os números podem ser ainda maiores, sobretudo o de feminicídios. Ela afirma que apesar de a oscilação em relação ao ano anterior não ser tão significativa, um crescimento de 0,5%, o número pode crescer ainda mais. O principal motivo é a mudança da tipificação de alguns homicídios para feminicídios em investigações que ainda estejam em andamento.

“Estamos diante de um crescimento de feminicídios há algum tempo, mas é importante destacar que alguns crimes de homicídio ainda vão passar por revisões, porque os dados provêm de boletins de ocorrência que são os primeiros registros dos crimes. É possível que ao longo das investigações mude a tipificação porque o delegado percebeu que a autoria foi de um parceiro íntimo e vai reclassificar o crime”, explica.

A diretora do Fórum também chamou a atenção para um crescimento no número de casos, ao mesmo tempo em que a pandemia da Covid-19 se tornou mais letal no Brasil, a partir do segundo trimestre.

“A partir desse momento os números disparam e isso mostra justamente que no período em que tivemos uma piora da pandemia e medidas de isolamento foram restabelecidas, houve um aumento acentuado. Essa é uma das hipóteses para o crescimento nos casos porque a violência contra a mulher cresceu em vários países do mundo durante a pandemia, então não é exatamente uma surpresa. Infelizmente isso já era esperado”.

 

com informações da Revista Marie Claire

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