Têm pipocado nas redes sociais conteúdos de casais “performando” humor utilizando situações que, numa análise minimamente criteriosa, fomentam a submissão de esposas e companheiras diante do homem provedor.
– Como esconder as compras para que o marido não veja;
– Mil maneiras de acessar o celular do marido;
– O fardo de cuidar sozinha da casa, dos filhos e do marido inútil;
– A rotina de passar a madrugada cuidando de um recém-nascido enquanto o marido ronca no quarto ao lado;
– Pagar uma certa quantia para que a esposa não encha o saco durante o final de semana em que o marido sai com os amigos. E sem aliança.
Era pra ser engraçado, dizem. Só que não.
Não é engraçado, não é divertido. Estamos em 2024 e ainda há quem acredite que uma boa mulher é capaz de curar um homem mal diagramado, preguiçoso, sem um mínimo de educação e qualquer senso de responsabilidade.
Muitos desses perfis possuem um engajamento gigantesco. Outros entram na onda e por vezes me vem um questionamento honesto: até que ponto essas pessoas realmente vivem assim, ou estão preocupados apenas em gerar conteúdo e engajamento com o que está na moda?
Quando falamos sobre anônimos e recém-famosos que não possuem qualquer tipo de responsabilidade social, o melhor a fazer é ignorar, porque afinal de contas, existe liberdade de expressão, mesmo que alguns digam que estamos numa ditadura (pausa para os risos).
Mas existe uma parcela da sociedade que deve, sim, dar satisfações sobre seus atos. Eles são pagos com o meu dinheiro, e com o seu também. Por mais que você não se importe. Bem, eu me importo, e isso também tem a ver com o MEU papel social enquanto jornalista.
Cláudia Carvalho foi uma das primeiras jornalistas que conheci quando decidi morar em João Pessoa, e lá se vão quase 20 anos. Desde o primeiro momento, me coloquei como fã e admiradora do seu trabalho, e ela sabe disso.
No último sábado (4), Cláudia postou uma matéria no portal Parlamento PB: Deputado “paga” à esposa por “vale night”; entenda porque isso estimula violência (leia aqui, na íntegra). Em resumo, o deputado estadual Walber Virgulino joga notas de R$ 50 e R$ 100 reais na frente da esposa para ter um fim de semana longe dela. “Tome mais mil para eu voltar somente segunda-feira e sem aliança”, diz, dando as costas à mulher que apenas pergunta: “Como é?”.
Na matéria, fica bem explicado o porquê dessas atitudes serem consideradas violências. O texto está irretocável, os argumentos, idem.
Entre janeiro e agosto de 2023, mais de 10 mil mulheres vítimas de violência doméstica entraram com pedido de medida protetiva na Paraíba, segundo dados da Justiça da Paraíba.
Na Paraíba, em média duas mulheres foram mortas por mês em 2023 por sua condição de gênero. No ano passado, o número de feminicídios cresceu 30% e o estado registrou 34 feminicídios, contra 26 em 2022.
Mas enquanto representante do povo, o deputado usou de seu poder para acusar a imprensa paraibana de estar “emburrecida pelo dinheiro” e insinuou que o conteúdo teria sido motivado pelo “toco”, gíria para propina. Tanto o Parlamento PB, veículo que galgou uma longa estrada de credibilidade e respeito aos leitores, quanto a jornalista Cláudia Carvalho, agora sofrem ataques promovidos pelo “apito de cachorro” (se você não sabe o que esse termo significa, dê um Google).
Enquanto jornalista que atua diretamente nas questões da violência de gênero, enquanto mulher, e enquanto amiga, exponho minha solidariedade à Cláudia Carvalho, aos que fazem o Parlamento PB, e aos colegas da imprensa paraibana que fizeram (e continuam fazendo) resistência à extrema direita.
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado da Paraíba, a Associação de Mídia Digital (Amidi) e a Associação Paraibana de Imprensa (API) emitiram nota em solidariedade a Cláudia Carvalho, repreendendo a conduta agressiva e desnecessária do deputado Walber Virgulino. Leia as notas:
A Associação de Mídia Digial (Amidi) e a Associação Paraibana de Imprensa (API) repudiam o tratamento do deputado estadual Wallber Virgolino contra a jornalista Cláudia Carvalho e a imprensa paraibana, ao se pronunciar de maneira acusatória e injuriosa aos profissionais da mídia do nosso estado.
O parlamentar usou o espaço dedicado aos comentários em uma rede social para fazer insinuações levianas e genéricas contra a imprensa do nosso Estado.
Os ataques teriam sido motivados após produção de matéria jornalística elaborada pelo ParlamentoPB, veículo da mídia digital dirigido pela jornalista Cláudia Carvalho, sobre vídeo postado pelo deputado em suas redes sociais.
A Amidi e a API lamentam a forma e o tom usados pelo parlamentar para rebater o texto publicado pelo site.
Ressaltamos que o deputado, como qualquer cidadão, tem o direito de divergir de conteúdos e opiniões, bem como solicitar direito de resposta ao veículo de comunicação. Contudo, o modo como Walber Virgulino se comportou, optando pela desqualificação e ofensa ao invés da argumentação, atenta contra a liberdade de imprensa e a prática do exercício profissional jornalístico.
As entidades se solidarizaram com a jornalista Cláudia Carvalho e com todos os jornalistas e comunicadores da Paraíba ofendidos e difamados pelo citado político, ao tempo que sugere à referida autoridade legislativa revisão da postura autoritária dispensada ao contraditório.
Associação de Mídia Digial (Amidi)
Associação Paraibana de Imprensa (API)
SINDICATO DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS DO ESTADO DA PARAÍBA
O deputado estadual Wallber Virgolino atacou uma jornalista e por tabela toda a imprensa paraibana ao reagir de maneira violenta contra uma matéria elucidativa produzida pelo ParlamentoPB e por sua editora, Cláudia Carvalho. O texto analisava o discurso de um vídeo em que o deputado, em tom de brincadeira, oferecia dinheiro à esposa para ir a uma vaquejada e passar o fim de semana fora de casa e “sem aliança”.
De humor questionável, o conteúdo de Wallber naturaliza diversas facetas de comportamentos tóxicos contra as mulheres.
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais da Paraíba repudia as acusações desequilibradas e irresponsáveis do deputado Wallber Virgolino e se coloca em defesa da imprensa paraibana, que para o deputado “não respeita nada, nem ninguém”. Talvez, em um juízo distorcido, o “respeito” seja equiparado à subserviência. Essa, sim, não é típica dos aguerridos comunicadores e comunicadoras da Paraíba.
Nossa solidariedade a Cláudia Carvalho, jornalista do batente há décadas, empregada pública por mérito e aprovada em concurso público, além de diretora desta entidade, profissional engajada na luta pelos direitos das mulheres e humanos, que incluem além da não violência, a busca pela verdade, contraditório, respeito e a não distorção dos fatos.
Ao parlamentar em questão, nosso repúdio. Não aceitar críticas é comportamento típico de quem é anti-democrático. Uma lástima para alguém que foi escolhido para representar o povo.
A DIRETORIA