Vergonha e medo – de que os outros saibam e de serem desacreditadas – são os principais motivos apontados por brasileiros para que as mulheres não procurem a polícia em caso de estupro. Um fato que infelizmente, nós já sabíamos, mas que foram confirmados na pesquisa Percepções sobre estupro e aborto previsto por lei, feita pelo Instituto Patrícia Galvão e pelo Instituto Locomotiva.
De acordo com o levantamento, a maioria acredita que as vítimas não costumam denunciar os casos (53%). Entre esse grupo, também a maioria (66%) aponta o constrangimento como razão para manter silêncio perante as autoridades. A mesma parcela (66%) também considera a “vergonha” um importante fator que limita as denúncias.
Entre as mulheres que participaram da pesquisa, 9% respondeu que não contariam sobre a agressão a ninguém. Nesse grupo, 66% disse que o motivo era “vergonha ou constrangimento”, seguidos por “medo de ser exposta publicamente” (41%) e “por não achar que acreditariam em mim”(38%).
Outras justificativas apresentadas foram medo de represálias por familiares ou amigos (32%), por colegas ou professores (24%), abalo emocional (27%), temor de retaliações por parte do agressor (20%) e sensação de culpa (14%).
A pesquisa foi feita com 2 mil pessoas com mais de 16 anos de modo online entre 1º a 14 de setembro. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais.
O debate sobre as barreiras para denunciar esse tipo de agressão vieram à tona após vir a público na última semana o vídeo da audiência de julgamento que resultou na absolvição do empresário André de Camargo Aranha, acusado de ter estuprado a promotora de eventos Mariana Ferrer.
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Nas imagens, o advogado responsável pela defesa de Aranha, Claudio Gastão da Rosa Filho, acusa Mariana para tirar proveito da situação. Ele mostra fotos sensuais da promotora de eventos “com posições ginecológicas”, segundo ele, e aposta em uma estratégia de defesa de desqualificar a possível vítima de estupro ― conduta que não é exceção no sistema de Justiça brasileiro.
Segundo o Anuário de Segurança Pública, do FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), em 2019, 66.123 boletins de ocorrência de estupro e estupro de vulnerável foram registrados em delegacias de polícia e 85,7% das vítimas eram do sexo feminino. Com a subnotificação, alguns especialistas estimam que o número real supere 400 mil estupros por ano no Brasil.
Segundo a pesquisa, 57% dos homens dizem ter certeza que mulheres próximas, como esposa, filha, mãe ou amiga, contariam para ele se fossem vítima de estupro. Outros 33% acreditam que “provavelmente contariam”, e 10% que não contrariam. Já 89% crê que esse menor grupo contaria caso engravidasse após um ato de violência sexual. Entre os homens entrevistados, 92% respondem que essas mulheres próximas procurariam a polícia após um estupro.
Para quase todos entrevistados (98%), as pessoas devem denunciar se descobrirem que uma menina está sendo estuprada em casa e 87% discorda da ideia de que se a agressão sexual ocorre no domicílio deve ser resolvida de forma privada. Esse tipo de situação é preponderante. De acordo com o Anuário de Segurança Pública, em 84,1% dos casos de estupro, o agressor era conhecido da vítima.
Para 33% dos entrevistados, vítimas de estupro não contam com apoio de outras pessoas para denunciar o crime à polícia e 79% acredita que quando esse suporte existe, vem da família e dos amigos.
Sobre o atendimento policial, 29% respondeu que a polícia está muito preparada, 49% “um pouco preparada” e 22% não preparada. No terceiro grupo, falta de treinamento e de sensibilidade são apontadas como as principais falhas, respectivamente, 67% e 66% das respostas. Em seguida, aparece “não levam a sério a palavra da mulher” (61%), culpam a vítima (57%) e falta de funcionários (18%).
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da redação, com Agência Patrícia Galvão