Na manhã do dia 7 de abril de 2011, a Escola Municipal Tasso da Silveira, bairro de Realengo, na Zona Norte do Rio, realizaria uma palestra com ex-alunos para que falassem da sua vida fora da escola. Wellington Menezes de Oliveira, então com 23 anos, parou diante do portão da escola, se apresentou como palestrante e entrou. Na mochila, Wellington levava dois revólveres.
Dentro do colégio, ele pediu uma cópia de seu histórico escolar na secretaria, cumprimentou uma antiga professora de Literatura com um beijo na testa e subiu para o segundo andar, onde invadiu uma sala da 8ª série.
Ali, cerca de 40 alunos assistiam a uma aula de Português. Wellington começou a atirar. Segundo os sobreviventes, ele mirava na cabeça das meninas e no corpo dos meninos. Todos foram disparados à queima-roupa. Enquanto recarregava as armas, o assassino invadiu uma segunda sala, em frente à primeira, e recomeçou o massacre.
Muitos alunos, ao ouvirem os tiros, saíram de suas salas e correram, assustados, para o terceiro e o quarto andares. Na fuga, muitos caíram e foram pisoteados. Alguns professores montaram barricadas na porta de suas salas com mesas e carteiras e mandaram os estudantes para o fundo da classe.
Mesmo ferido no rosto, no ombro e em uma das mãos, Allan Mendes da Silva, de 13 anos, conseguiu escapar e pedir socorro a três PMs que faziam uma blitz a 200 metros dali. O primeiro a chegar foi o sargento Márcio Alexandre Alves, de 38 anos. O atirador se preparava para subir para o terceiro andar quando ouviu o oficial gritar: “Larga a arma. É a polícia!”.
Wellington chegou a apontar a arma em sua direção, mas não disparou. Foi atingido com um tiro de fuzil na barriga. Caído no chão, ele atirou na própria cabeça. Em carta, o criminoso disse ter sido vítima de bullying na escola.
No final, 12 crianças entre 13 e 15 anos foram assassinadas. Desse total, 10 eram meninas. E isso não foi coincidência.
O Massacre do Realengo completou dez anos nesta quarta-feira (7) e deixou traumas nos sobreviventes, medo nas famílias e abriu o questionamento sobre o acesso às armas no Brasil. Mas pouco se falou sobre os motivos reais que levaram Wellington a cometer essa tragédia. Sim, ele sofria bullying na escola, mas não foi só isso.
A professora e ativista Lola Aronovich foi uma das poucas vozes, à época, que se debruçou de fato nas questões sobre o crime, e a relação direta com o machismo e misoginia nas motivações. “A mídia, pra variar, não soube explicar o que aconteceu. Para tentar justificar a desproporção no gênero das vítimas, inventou hipóteses machistas, como que meninas sentam-se na frente da sala, ou (pasmem) correm menos rápido que meninos, e por isso foram alvejadas”.
“Na época não se chamou o massacre pelo nome: feminicídio”.
Crimes de ódio contra as mulheres
Em março de 2012, a Polícia Federal em Curitiba deflagrou hoje a “OPERAÇÃO INTOLERÂNCIA” que identificou os responsáveis pelas postagens criminosas num blog que fazia apologia à violência, sobretudo contra mulheres, negros, homossexuais, nordestinos e judeus, além da incitação do abuso sexual de menores. Os criminosos também apoiaram o Massacre do Realengo.
“Naquele ano, muitos dos veículos que deram a notícia da prisão esqueceram o ‘detalhe’ da misoginia, e descreveram o blog apenas como racista e homofóbico”, afirma Lola. “E o que o blog de ódio tem a ver com o massacre de Realengo? Muita coisa. Pra começar, quando aconteceu o massacre, a polícia investigou vários blogs e fóruns masculinistas, porque havia a forte suspeita que Wellington era um frequentador assíduo desses espaços”, diz a professora, que pesquisou sobre esses fóruns e blogs.
Ela conta que logo após o crime do Realengo, as páginas foram fechadas de forma quase coordenada.
Aquele foi o primeiro grande crime que conseguiu alcance. Mas não foi o único. Ao longo dos anos, outros crimes de ódio contra mulheres e gays continuaram a acontecer incentivados pelos blogs e fóruns de ódio. O último que temos notícia foi o de Guilherme Alves Costa, de 18 anos, que foi preso em flagrante após assassinar a facadas uma jovem de 19 anos. Releia aqui.
Vamos falar mais sobre o que são os masculinistas e sua rede de perversão e violência, escondidos pelo anonimato da internet. São, em resumo, homens jovens frustrados que encontram nesses espaços, o lugar perfeito para compartilharem seu ódio.
Da redação, com informações do Blog da Lola, BBC Brasil, e portal da Polícia Federal