Quando o presidente da República declarou, em mais de uma oportunidade, que “pintou um clima” com meninas venezuelanas, ele verbalizou uma situação criminosa que, infelizmente, é bem real e presente. Dados do Anuário de Segurança Pública, relativos a 2021, apontam que 58,8% das notificações dos crimes de estupros no Brasil, foram cometidos contra crianças e adolescentes. Outro dado alarmante: do total de 45.994 estupros de vulnerável, 35.735, ou seja, 61,3%, foram cometidos contra meninas entre 10 e 13 anos.
Sobre o perfil dos criminosos, aquilo que já sabíamos: homem (95,4%) e conhecido da vítima (82,5%), sendo que 40,8% eram pais ou padrastos; 37,2% irmãos, primos ou outro parente e 8,7% avós. O local da violência também permanece o mesmo: 76,5% dos estupros acontecem dentro de casa.
Esses dados apontam que as políticas de prevenção são extremamente mais urgentes que as ações de repressão. E quando se fala em prevenir um crime que acontece dentro de casa, longe dos olhos das autoridades e do poder público, essa conta fica difícil de fechar, mas existem caminhos.
Um deles é começar a rechaçar, imediatamente, a normalização de atitudes como as falas do presidente. Aceitar que pode “pintar um clima” entre um homem adulto e uma menina, é fomentar a cultura de que os corpos femininos são propriedade masculina, não importa a idade que tenham. O presidente “vomitou” uma situação que é rotineira na vida de praticamente todas as mulheres brasileiras.
O perfil do Paraíba Feminina no Instagram lançou a pergunta: “Qual idade você tinha a primeira vez que um homem sentiu que ‘pintou um clima’ entre vocês?” Foram mais de 130 respostas e a idade mínima foi de 5 anos.
Outra saída é investir nos Centros de Referência de Assistência Social (Cras), Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) que são órgãos responsáveis por fazer o acompanhamento direto das famílias em situação de vulnerabilidade social. Mas, de acordo com Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) enviado pelo Governo Federal para o Congresso Nacional no último mês de agosto, há a previsão de corte de 95% nos recursos destinados ao SUAS – Sistema Único de Assistência Social, justamente o órgão que faz o repasse para os Cras e Creas.
A fala do presidente foi criminosa sim, e apesar da tentativa frustrada de remediar a situação, tudo isso faz parte de um projeto de destruição, tanto das políticas públicas, quanto da nossa própria existência.
Taty Valéria
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