Por Priscila Werton
Yasnaia Pollyanna Werton Dutra tem esse nome porque seu pai era um exímio leitor e de suas leituras tirou os nomes de suas três filhas: Yawama, Ramayama e Yasnaia. Funcionário do DNOCS, de uma família de não políticos, trabalhou ajudando a matar a sede do povo sertanejo do interior da Paraíba e talvez tenha vindo daí o interesse social que Pollyanna cultiva até hoje em cuidar do Sertão.
Pollyanna tem 45 anos, três filhos e, apesar de ser uma jovem mulher, tem uma trajetória robusta de rompimento com a política tradicionalmente machista da Paraíba, principalmente no interior. Sua jornada política começou como secretária de saúde do município de Pombal, onde apurou seu olhar para as necessidades do povo e começou a aprender sobre gestão pública.
Aos 30 anos ficou viúva, seu marido, e prefeito de Pombal à época, teve uma morte prematura em um acidente de trânsito deixando-a com um filho de 04 anos, em um contexto em que o vice-prefeito era seu maior desafeto político e de um dia para o outro ela se viu sem emprego, sem marido, com uma criança para criar sozinha.
Seu pai já havia morrido alguns anos antes vítima de câncer de pulmão. Então, a família sertaneja mantida só por mulheres: ela + suas duas irmãs e a mãe Lídia (sua maior fã e alicerce para tudo na vida) permitiu que dessa situação de caos surgisse uma verdadeira guerreira. Pollyanna não só ganhou a eleição seguinte em um ato político movido pela própria população, como ainda se reelegeu abrindo um precedente na Lei brasileira onde uma mulher que ficou viúva de um prefeito passou a poder ter dois mandatos também como prefeita.
Sua trajetória como prefeita é descrita lindamente pelas professoras Glória Rabay, Maria Eulina Pessoa de Carvalho e Lucimeiry Batista da Silva no artigo “AS PREFEITAS PARAIBANAS DE 2013 A 2016” apresentado no Seminário Internacional Fazendo Gênero em Florianópolis, alguns anos atrás. No artigo, as professoras mostram como a prefeita do tipo “esposa” se transformou em prefeita “por iniciativa própria” quando Pollyanna tomou para si a missão de cuidar dessa cidade e cuidou, deixando feitos de destaque mundial e marcando a história da pequena Pombal em antes e depois de Pollyanna.
Na gestão de Pollyanna aconteceu um feito singular no Brasil: centenas de famílias de Pombal devolveram seus benefícios do Bolsa Família por terem saído da faixa da fome, graças aos programas que Pollyanna implementou junto à Lula de incentivo à microempreendedores, para que outras famílias também pudessem mudar de vida com a ajuda do governo. Pollyanna conta que o foco era empoderar as mulheres pombalenses fornecendo as ferramentas para que abrissem seus próprios negócios e conquistassem não só a sobrevivência no Sertão, mas a independência financeira.
Essa é a política que eu quero ver. Uma política de parcerias inteligentes que mata a fome e permite mobilidade social com assistencialismo adequado, ofertando ao povo condições de seguir sua vida conquistando a autonomia do auxílio do governo quando não for mais necessário.
Pollyanna prefeita do interior da Paraíba foi chamada por Lula para falarem desse feito e, logo depois foi para a ONU, em Nova York, contar para o mundo como ela fez para atender aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e zerar a mortalidade materno-infantil numa cidadezinha pobre de pouco mais de 30mil habitantes no interior da Paraíba.
Durante minha formação médica, tive a chance de acompanhar o que aconteceu em Pombal no governo que se iniciou por Jairo e que Pollyanna transcendeu brilhantemente. Pombal ganhou um campus da Universidade Federal de Campina Grande, SAMU, UPA, o SUS de Pombal funcionava! Tive a honra de acompanhar colegas nos serviços de saúde na época de Pollyanna: os PSFs tinham médicos, a farmácia básica funcionava, assistência terciária era muito presente na cidade, as gestantes não precisavam mais viajar para outros municípios para fazerem pré-natal de alto risco, por exemplo. Pollyanna trouxe médicos cubanos para a cidade e garantiu atendimento para as populações rurais que nunca haviam tido assistência plena pelo SUS.
Pollyanna mudou a história daquele povo para sempre! Depois que Pollyanna concluiu sua jornada por lá, veio para João Pessoa como secretária adjunta na Secretaria de Planejamento e em seguida os políticos machistas e retrógrados que a sucederam quase que literalmente arrancaram os avanços daquela cidade de seu povo. Depois de formada voltei à cidade como médica para participar do programa Mais Médicos e vivi na pele o que aconteceu no SUS de Pombal depois da saída de Pollyanna: pré-natal de alto risco não tem mais na cidade, centro de reabilitação para vítimas de doenças cerebrovasculares foi sucateado até não ter mais condições de abrir suas portas à população, policlínica com especialidades não oferece mais os mesmos serviços e a antiga política de ofertar produtos da saúde em troca de voto, cabresto político, tomou de volta aquele povo, que hoje é refém. Atualmente Pombal é administrada por um prefeito que, apesar de médico, entende infinitamente menos de saúde pública do que Pollyanna que se debruçou nos estudos para aprender como ajudar aquele povo sofrido que passava fome e sede.
Pollyanna chega à Assembleia Legislativa e, entre as coisas lindas que ela fez pela saúde de Pombal e de vários outros municípios na Paraíba no manejo da crise sanitária que tivemos nos últimos anos, destaco as verbas para o Hospital Regional de Pombal que ela lutou incansavelmente para conseguir e tudo que pôde fez para que aquele povo abandonado pelo SUS da cidade nas mãos de um homem carrasco não morresse por Covid, sempre tendo apoiado a medicina baseada em evidências e defendido a ciência.
Recentemente Pollyanna pôs fim a um absurdo que vivíamos aqui no estado quando mulheres casadas precisavam de autorização de seus maridos para colocar DIU usando serviços particulares de saúde. Pollyanna foi a autora da lei que pôs fim a uma realidade medieval na Paraíba em pleno século XXI.
Pollyanna cresceu politicamente como uma mulher alvo de homens agressivos, lembro das vezes em que a vi chorando por humilhações que sofreu, ataques a sua honra, ao seu direito de ser mulher e ocupar espaços de importância na política. Mas ela nunca desistiu! Enxugava as lágrimas e sempre soube que os ataques simbolizavam a força que cada dia mais ela possuía e como esses homens se viam pequenos perto dela e que é assim que age quem não tem bons argumentos e inteligência como a dela: com ofensa e machismo.
Pollyanna reconstruiu sua família e sua carreira política com suas próprias mãos. Saiu de uma realidade em que recebia xingamentos de homens vazios e invejosos para ser aplaudida pelo presidente do país, pela ONU e hoje recebe a chance de mostrar para a Parahyba e para o Brasil a política que ela aprendeu na dor a como fazer. E ela sabe.
Alerta conflito de interesse: Pollyanna é irmã de minha mãe, além disso, posso dizer que somos amigas, e que tenho por ela grande admiração e orgulho pelo baluarte feminino que ela representa para nossa família e agora para Paraíba e Brasil!
Segue o link para o artigo acadêmico supracitado que fala sobre a trajetória política das prefeitas da Paraíba e, consequentemente, sobre Pollyanna
http://www.fg2013.wwc2017.eventos.dype.com.br/resources/anais/20/1385662442_ARQUIVO_GloriaRabay.pdf
Conheça os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio:
@priscilawerton é médica, feminista e defensora do SUS